A Tipicidade Penal da “Roleta-Russa do Sexo”

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Por Jeferson Botelho
Delegado Geral de Polícia – Aposentado. Prof. de Direito Penal e Processo Penal. Mestre em Ciência das Religiões pela Faculdade Unida de Vitória/ES. Especialização em Combate à corrupção, antiterrorismo e combate ao crime organizado pela Universidade de Salamanca – Espanha. Advogado. Autor de livros

Mensagem exordial

O professor Jéferson Botelho, em uma abordagem pioneira no Brasil, traz à tona os primeiros estudos jurídicos acerca de um tema que tem chamado a atenção da sociedade brasileira. É imperativo que a sociedade, em todas as suas esferas — famílias, educadores, autoridades e cidadãos —, una esforços para enfrentar esse fenômeno. A implementação de políticas públicas educacionais afirmativas e a promoção de campanhas de conscientização são passos essenciais para proteger nossas crianças e adolescentes de práticas que ameaçam sua saúde física e mental. Ergue‑se, pois, diante de todos nós, o inquebrantável compromisso de salvaguardar a dignidade sexual de nossas crianças e adolescentes — não como mera obrigação legal, mas como juramento civilizatório que forja a alma de uma nação. À família incumbe o cuidado primordial, ao Estado impõe‑se a responsabilidade reguladora, à escola cabe o ensinamento cuidadoso e ao júri cabe o crivo da justiça, formando juntos um manto protetor tão vasto e impenetrável quanto a esperança de um futuro livre de violência. Que cada um desses pilares atue em sinfonia, infundindo vigilância permanente e solidariedade ativa, para que nenhuma afronta ouse desfigurar a inocência de quem ainda constrói o seu destino. Eis o verdadeiro legado de um povo soberano: a certeza de que, quando erguemos a bandeira da proteção infantojuvenil, edificamos um alicerce de coragem e bem‑estar que perdurará pelas eras.

Convido todos a uma reflexão profunda sobre os valores que estamos transmitindo às futuras gerações. Que este estudo sirva como um chamado à ação, para que possamos construir uma sociedade mais consciente, responsável e comprometida com o bem-estar de todos.

Dedicatória

Dedico este ensaio jurídico à ilustre psicanalista e neurocientista Dra. Andréa Vermont, cuja coragem e lucidez trouxeram à luz um fenômeno alarmante que assola silenciosamente a juventude brasileira: a chamada “roleta-russa sexual”. Ao revelar o caso de uma adolescente de 13 anos que engravidou após participar dessa prática em uma festa escolar, Dra. Vermont não apenas expôs uma realidade perturbadora, mas também lançou um chamado urgente à sociedade para enfrentar essa crise com responsabilidade e ação concreta.

Sua iniciativa transcende o relato de um caso isolado; é um grito de alerta que ecoa nos corredores das escolas, nos lares e nas instituições públicas. Como uma verdadeira sentinela da dignidade infantojuvenil, Dra. Vermont ilumina os caminhos da prevenção e da educação sexual responsável, desafiando-nos a romper o silêncio e a omissão diante de práticas que comprometem o futuro de nossas crianças e adolescentes.

Que sua voz ressoe como um farol para legisladores, educadores, profissionais da saúde e famílias, inspirando políticas públicas afirmativas e ações concretas que assegurem a proteção integral da juventude brasileira. Uma mineira de Uberlândia que, com sua dedicação e compromisso, lança luz sobre as sombras da ignorância e da negligência, guiando-nos na construção de uma sociedade mais justa, consciente e segura para as futuras gerações.

RESUMO:

Portanto, este artigo analisa, sob a ótica penal e civil, a tipicidade de condutas envolvendo adolescentes e crianças em práticas libidinosas coletivas, com ênfase no caso amplamente divulgado em que uma adolescente de 13 anos engravidou durante a denominada “roleta-russa sexual” numa festinha da escola. Na prática, segundo relato da brilhante neurocientista, Dra. Andrea Vermont que contou os fatos nas redes sociais, os meninos ficavam sentados, excitados, com ereção, e as meninas passavam sentando. A investigação jurídica gira em torno da imputação penal do crime de estupro de vulnerável, além de outros delitos, bem como dos desdobramentos cíveis referentes à investigação de paternidade, alimentos e registro da criança. Reafirma-se a importância da atuação estatal eficaz e tempestiva, com fundamento na prevenção geral e especial negativa, como instrumento de tutela da dignidade sexual de crianças e adolescentes.

Palavras-chave: Estupro de vulnerável; roleta-russa sexual; dignidade sexual; prevenção penal; investigação de paternidade; responsabilidade civil.

INTRODUÇÃO

A proteção da dignidade sexual da criança e do adolescente constitui um dos pilares do ordenamento jurídico brasileiro, estando solidamente assegurada na Constituição Federal, no Estatuto da Criança e do Adolescente, no Código Penal e em Convenções e Tratados Internacionais, a exemplo da Convenção sobre os Direitos da Criança foi adotada pela Assembleia Geral da ONU em 20 de novembro de 1989. Entrou em vigor em 2 de setembro de 1990; trata-se, portanto, de instrumento de direitos humanos mais aceito na história universal. Foi ratificado por 196 países. O Brasil ratificou a Convenção sobre os Direitos da Criança em 24 de setembro de 1990.

Recentemente, um episódio de grande repercussão pública reacendeu o debate sobre os limites entre a liberdade sexual e a responsabilidade penal: uma adolescente de 13 anos engravidou-se após participar de uma prática denominada “roleta-russa sexual”, numa escola, na qual teria havido interação coletiva de natureza libidinosa entre crianças e adolescentes, conforme informações fornecidas nas redes sociais por uma educadora, o que gerou grande repercussão social e jurídica.

Na prática, segundo relato da excelsa psicanalista Dra. Andrea Vermont, que contou os fatos nas redes sociais, os meninos ficavam sentados, excitados, com ereção, e as meninas passavam sentando. A menina teria dito à professora não saber quem é o pai da criança visto ter praticado relações sexuais com vários homens.

À luz do art. 217-A do Código Penal, condutas sexuais envolvendo menores de 14 anos, mesmo com seu eventual consentimento, configuram crime de estupro de vulnerável. Tal norma tutela a dignidade sexual da criança, prescindindo de qualquer demonstração de violência ou ameaça. Este artigo propõe uma análise crítica da responsabilização penal e civil dos envolvidos, bem como da necessária atuação estatal diante do resultado gravidez.

ANÁLISE CRÍTICA DOS FATOS E DA RESPONSABILIDADE PENAL

No caso em comento, a prática da “roleta-russa sexual” envolveu adolescentes em condutas de cunho sexual explícito, culminando com a gravidez de uma menor de 13 anos. Ainda que ocorra com o aparente consentimento da vítima, o Código Penal Brasileiro adota a presunção legal de vulnerabilidade objetiva até os 14 anos de idade (art. 217-A), tornando irrelevante o consentimento, experiência sexual prévia ou existência de vínculo afetivo com os envolvidos, conforme pacificado pela Súmula 593 do STJ, cujo teor dispõe que o crime de estupro de vulnerável se configura com a conjunção carnal ou prática de ato libidinoso com menor de 14 anos, sendo irrelevante eventual consentimento da vítima para a prática do ato, sua experiência sexual anterior ou existência de relacionamento amoroso com o agente.

A análise da tipicidade penal deve observar as regras do concurso de pessoas (art. 29, CP), examinando isoladamente a conduta de cada agente:

I – Se maior de 18 anos, o agente será responsabilizado por estupro de vulnerável, com pena de reclusão de 8 a 15 anos, podendo ser preso em flagrante;

II – Se entre 12 e 18 anos, haverá ato infracional análogo ao estupro de vulnerável, sendo cabível medida socioeducativa de internação de até 3 anos (art. 122, §2º, ECA);

III – Se menor de 12 anos, aplicar-se-ão as medidas de proteção previstas nos arts. 98 e 101 do ECA.

O resultado gravidez agrava a repercussão do fato, pois além da violação à dignidade sexual, impõe à vítima e ao nascituro consequências físicas, emocionais e jurídicas. A presença do estado gravídico reforça a materialidade do delito e potencializa a censurabilidade da conduta.

DO ESTUPRO DE VULNERÁVEL BILATERAL

A vítima de 13 anos que se tenha se engravidado, mas que tenha mantido relações sexuais com autor menor de 14 anos de idade na roleta-russa, além de vítima na relação material, também figura como autora de ato infracional análogo ao crime de estupro de vulnerável, artigo 217-A do Código Penal. Quer dizer: ela será considerada vítima e autora ao mesmo tempo de ato infracional semelhante ao crime de estupro.

A ROLETA-RUSSA SEXUAL E A SAÚDE PÚBLICA

Além da tipicidade penal do estupro, visto alhures, existem outras duas questões relevantes. Esse comportamento promíscuo pode conduzir a fenômenos comportamentais de risco extremo, como o “barebacking” — relações sexuais sem proteção entre indivíduos conscientes da presença de doenças sexualmente transmissíveis. Esse comportamento tem sido objeto de análise por especialistas em neurociência, que buscam compreender os mecanismos cerebrais que levam a tais condutas autodestrutivas.

A jurisprudência brasileira tem enfrentado desafios ao tipificar essas condutas, muitas vezes enquadrando-as como estupro ou mesmo homicídio com dolo eventual, dada a consciência do risco e a aceitação do possível resultado letal.

FUNDAMENTOS JURÍDICOS

O arcabouço jurídico que embasa a responsabilização penal e civil dos envolvidos é robusto. Além do art. 217-A do CP, destacam-se:

I – Art. 29, CP – Responsabilização penal no concurso de pessoas;

II – ECA (Lei 8.069/1990) – Proteção integral da criança e do adolescente e aplicação de medidas protetivas e socioeducativas;

III – Súmula 593 do STJ – Estupro de vulnerável independe de consentimento ou experiência sexual;

IV – Art. 1.606 do Código Civil – Reconhecimento judicial da paternidade;

V – Lei 12.004/2009 – Investigação de paternidade com base em exame de DNA.

A responsabilização cível exige a instauração de ação de investigação de paternidade, com coleta compulsória de material genético dos supostos genitores, a fim de se garantir o direito ao nome, alimentos, registro civil e demais obrigações paternas, em conformidade com o princípio do melhor interesse da criança.

CONCLUSÃO

“Essa questão da roleta-russa é real, não é a primeira, acontecem dezenas, recebi centenas de dezenas de relatos de profissionais de educação, de saúde, que passaram e viveram situações muito parecidas; sim ela é real; aliás eu sou real, eu jamais vou para a rede para contar mentiras. Andrea, você conta tantos casos, pois é, por que tantos casos vêm até a mim? nós terapeutas, psicanalistas, psicólogos, somos pessoas que ouvem os outros, e aí vão chegar várias histórias, eu costumo dizer que nós profissionais da saúde, em especial, psicoterapeutas, psicólogos, psicanalistas, carregamos nos ombros o peso da dor do mundo inteiro; as pessoas acham é que é simples para mim, tendo uma filha adolescente, e tendo que ter narrado, ouvido, assistido, e apoiar uma história como essa. Gente, eu sou humana, eu tenho carne, eu tenho osso, e quando corta, sangra, mas nós profissionais de saúde, muitas vezes carregamos essa dor, e esse peso, a gente segue, mas a gente continua, porque a gente está aqui, para dar a mão para outras pessoas e ajudar as pessoas a terem mais qualidade de vida, mas sim, jurista Jeferson Botelho, ela é real” (Andrea Vermont – 17/04/2025)[1]

[1] VERMONT. Andrea. Palavras da excelsa Psicanalista, filósofa e neurocientista, durante Live em 17 de abril de 2025, às 19 horas.

O episódio ora analisado revela a urgente necessidade de políticas públicas de educação sexual aliadas à aplicação firme da legislação penal. O envolvimento de adolescentes em práticas libidinosas coletivas constitui afronta direta à dignidade sexual infantojuvenil, exigindo resposta penal proporcional e eficaz.

Reafirma-se que o crime de estupro de vulnerável está plenamente configurado no caso da gravidez da menor de 14 anos, aqui retratado, sendo a responsabilização penal e cível dos envolvidos medida que se impõe. A apuração da paternidade deve ser feita com base em exames genéticos, com vistas a assegurar os direitos fundamentais da criança que nascerá. Aliás, a Lei Federal 12.004, de 2009, assevera que na ação de investigação de paternidade, todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, serão hábeis para provar a verdade dos fatos. E mais que isso. A recusa do réu em se submeter ao exame de código genético – DNA gerará a presunção da paternidade, a ser apreciada em conjunto com o contexto probatório.

A atuação estatal deve ser orientada pelos princípios da prevenção geral negativa (intimidar potenciais infratores) e da prevenção especial negativa (neutralizar o agente infrator), demonstrando que a lei penal é funcional, eficaz e possui aptidão para reprimir e inibir condutas socialmente reprováveis.

O presente incidente, ao envolver conduta sexual com menor de 14 anos, enquadra‑se de forma inconteste no escopo do art. 217-A do Código Penal Brasileiro, impondo-se a aplicação da pena de reclusão de 8 a 15 anos. A análise individualizada de cada agente, em consonância com o princípio do concurso de pessoas (art. 29, CP), revela a necessidade de respostas graduadas: medida de proteção para inimputáveis (menores de 12 anos), medida socioeducativa para adolescentes entre 12 e 18 anos e persecução penal plena para maiores de idade. A inviolabilidade da dignidade sexual da vítima, consagrada pelo ordenamento, impõe censurabilidade máxima ao comportamento dos autores e legitima a sanção rigorosa.

A ocorrência de gravidez decorrente da “roleta‑russa sexual” exige, ainda, a instauração imediata de ação de investigação de paternidade, com coleta de material genético, nos termos da norma em vigor dos supostos progenitores. Só assim se assegura o exercício do direito ao nome, à prestação de alimentos e às demais obrigações parentais — medidas imprescindíveis à tutela integral da criança, nascidas da confluência entre direito penal e direito de família.

Na arena da prevenção criminal, compete ao Estado exercer com inflexível rigor as doutrinas da prevenção geral negativa — para fulminar eventuais pensamentos criminosos ao demonstrar a eficácia da lei penal — e da prevenção especial negativa — para neutralizar o agente infrator e impedir sua reincidência. Desse modo, reafirma‑se que o Direito Penal não é letra morta, mas um instrumento funcional de coibição e inibição de condutas socialmente reprováveis, capaz de proteger, com observância da técnica jurídica, a sacrossanta dignidade sexual de seus destinatários.

Por todo o exposto, impõe-se reconhecer que, em meio à complexidade do fenômeno jurídico conhecido como “roleta-russa sexual”, o sistema de justiça deve se erguer com firmeza, lucidez e senso de missão institucional. A cisão processual entre jurisdição comum e juízo da infância e juventude, embora tecnicamente imperiosa diante da coexistência de imputáveis e inimputáveis, não pode implicar uma fragmentação da resposta estatal. Pelo contrário, o imperativo constitucional da proteção integral da criança e do adolescente, bem como os princípios da dignidade da pessoa humana e da prevalência do interesse da vítima, exigem uma atuação coordenada, diligente e incisiva.

Neste cenário, a aplicação dos institutos da conexão e da continência não pode se afastar de uma interpretação teleológica e sistêmica, sob pena de se perder de vista a finalidade maior do Direito: assegurar justiça, restaurar a ordem jurídica violada e reafirmar a confiança social nas instituições democráticas. A existência de agentes maiores e menores de 18 anos envolvidos no mesmo contexto delitivo impõe, sim, a cisão procedimental — mas jamais a cisão da verdade, da ética ou da responsabilidade coletiva pelo enfrentamento de práticas repugnantes que atingem o âmago da dignidade sexual da vítima.

É nesse ponto que o Direito deve sair de sua frieza cartesiana para assumir seu papel histórico: ser espada da justiça e escudo dos vulneráveis. E, nessa jornada, cada juiz, promotor, defensor e operador jurídico é convocado não apenas como técnico da lei, mas como guardião da civilização. Que a roleta-russa jamais se torne uma metáfora da impunidade — e que o Direito, com a força de sua integridade, continue a girar sempre em direção à justiça.

Ergue‑se, pois, diante de todos nós, o inquebrantável compromisso de salvaguardar a dignidade sexual de nossas crianças e adolescentes — não como mera obrigação legal, mas como juramento civilizatório que forja a alma de uma nação. À família incumbe o cuidado primordial, ao Estado impõe‑se a responsabilidade reguladora, à escola cabe o ensinamento cuidadoso e ao júri cabe o crivo da justiça, formando juntos um manto protetor tão vasto e impenetrável quanto a esperança de um futuro livre de violência. Que cada um desses pilares atue em sinfonia, infundindo vigilância permanente e solidariedade ativa, para que nenhuma afronta ouse desfigurar a inocência de quem ainda constrói o seu destino. Eis o verdadeiro legado de um povo soberano: a certeza de que, quando erguemos a bandeira da proteção infantojuvenil, edificamos um alicerce de coragem e bem‑estar que perdurará pelas eras.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em Constituição. Acesso em 17 de abril de 2025.

BRASIL. Código Penal Brasileiro. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Disponível em DEL2848compilado. Acesso em 17 de abril de 2025.

BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Disponível em L8069compiladoa. Acesso em 17 de abril de 2025.

BRASIL. Código Civil. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Disponível em L10406compilada. Acesso em 17 de abril de 2025.

BRASIL. Lei nº 12.004/2009. Dispõe sobre a investigação de paternidade. Disponível em L12004. Acesso em 17 de abril de 2025.

BRASIL. O presente texto passou por ajustes estruturais e terminológicos para fins de adequação técnica e argumentativa. Fonte: ChatGPT. Acesso em 17 de abril de 2025

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Súmula 593. Disponível em STJ – Súmulas do STJ. Acesso em 17 de abril de 2025.

NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado. 18. ed. São Paulo: Forense, 2023.

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