O que eu posso fazer…

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Aníbal Gonçalves
Pedagogo

Caminho pela praça Tiradentes, em Teófilo Otoni, na manhã ensolarada deste último domingo, porém deste domingo sem nenhuma perspectiva. Diante dessa pandemia do novo Coronavírus alguns amigos estão muito preocupados com suas próprias vidas para que eu ouse incomodá-los com minha presença. Enquanto isso, posso dar-me a liberdade de pensar em muitas coisas assim díspares: se eu me chamasse Drummond, se eu tivesse os olhos negros, se eu fosse doente do peito como os poetas românticos dos tempos de Álvares de Azevedo, se eu estivesse morando em Paris sozinho e apaixonado.

Mas Teófilo Otoni não é Paris nem eu me chamo Drummond. E vem o tédio de sempre… o isolamento social de todo dia.

Já surgiu o inverno e as ruas ainda estão molhadas das lágrimas da noite, os automóveis passeiam ao meu redor repletos de gentes felizes por saírem de suas casas – apesar da Covid-19 – que desejam aproveitar as delícias do domingo enquanto a vida me espera na curva da próxima esquina feito um ladrão e sinto medo. Meus olhos por demais habituados a desvendar a simplicidade das coisas se confundem com a paisagem que posso chamar de suja e feia da praça Tiradentes em um domingo de manhã.

Me vem um desejo estranho de viajar – talvez como faz o Álvaro Garnero, não sei bem para onde, de desprender- -me das raízes, de abandonar tudo, de ser como se eu nascesse de novo, mas eu não posso nascer de novo. O que consigo fazer é caminhar pelas ruas perplexo diante da total inutilidade de minhas mãos inertes em transformar o tempo, o dia, a noite que chegará, bem sei.

O que posso fazer é caminhar pelas ruas espiando as casas.

O que posso fazer é caminhar pelas ruas feito um cão vadio ainda não encontrado por alguém da ONG Amemais.

Tenho uma vontade esquisita de entoar boleros, de ouvir Carlos Gardel tal como dona Rosa do saudoso Seu Maciel, em companhia dos netos Rafael, Mariana e Isabela, e dos filhos Maciel Neto e Fabrícia, esposa de Cesar – o genro preferido e único, o fizeram de certa feita em Buenos Aires, de dançar um samba de gafieira, ver um filme de Carlitos, beber até o total e absoluto esquecimento de quem sou, do que faço, do que vivo cada vez mais comprometido com a vida. E você… o que pode fazer..?!

Sobre o colunista: Aníbal Gonçalves é pedagogo, graduado em Administração Escolar, ex-diretor da Escola Estadual de Coroaci – MG [hoje Dona Sinhaninha Gonçalves] e professor de Filosofia, Sociologia e História da Educação. Foi chefe do Departamento de Educação Cooperativista da CLTO. Atualmente, jornalista e radialista da 98 FM (Teófilo Otoni) e colunista do Jornal Diário Tribuna.

1 COMENTÁRIO

  1. De onde veio tanta inspiração para tão bela crônica? Gde Abs e continue nos brindando filosoficamente!

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