Forças de segurança para mulheres: o duplo esforço

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Juliana Lemes da Cruz.
Doutoranda em Política Social – UFF.
Pesquisadora GEPAF/UFVJM.
Coordenadora do Projeto MLV.
Contato: julianalemes@id.uff.br

As coisas têm mudado, mas, o duplo esforço é real. O primeiro, de auto superação. O segundo, de paradigmas socioculturais a quebrar. Nesse ambiente, homens têm feito esforços para compreender as dinâmicas femininas e reconhecer privilégios masculinos tão naturalizados que nem são considerados “privilégios” pelos homens. Chegando à comemorável postura de não se sentirem atacados ou ameaçados quando se percebem diante de mulheres fortes.

No entanto, há homens que não estão dispostos a ouvir o que uma mulher tem a dizer, tampouco, atribuir relevância ao que julga ser importante. Vê-se muito discurso e pouca prática. Infelizmente, é apenas aparente a ideia de que as mulheres são respeitadas nos espaços que já ocupam. Certamente, esse alcance ainda demora algum tempo para se mostrar significativo o bastante para que não precisemos mais tocar nesse assunto, exibindo-o numa coluna de jornal. Uma das formas de se desconstruir posturas sociais amplamente difundidas como corretas é confrontá-las, apontando suas inconsistências. Nesse caminho, a ocupação feminina de lugares, há algumas décadas, não é associado a elas. A exemplo das forças de segurança pública.

Sem o compromisso com a modéstia símbolo da educação das mulheres desde a infância, há aquelas que desativam, permanentemente, o modo insegurança e se desafiam em profissões que perduraram por muito tempo sem a presença feminina, como é o caso da Polícia Militar mineira, a instituição militar estadual mais antiga do país. Em espaços essencialmente masculinizados, o desafio às mulheres é ainda maior.

Em Minas Gerais, são 2.933 policiais militares femininos, dentre as quais, 226 oficiais (coronéis, tenentes coronéis, majores, capitães e tenentes) e 2.473 praças (subtenentes, sargentos, cabos e soldados). O que representa 8,37% do efetivo de policiais militares de todo o Estado. No interior, atuam 53% delas e na região metropolitana de Belo Horizonte, 47% (TV PMMG, 2021).

Minas possui 853 municípios e nessa conjuntura, impossível contar com pelo menos uma policial do sexo feminino em cada município do estado, algo que ocorre no caso dos policiais masculinos. A PMMG é a instituição estadual com a maior capilaridade dentre todas, alcança a totalidade dos municípios. O percentual mineiro de mulheres integrantes das fileiras da corporação é menor que a média nacional, que chega a 11,59%, segundo dados da Pesquisa sobre o perfil das instituições de segurança pública tendo como base o ano de 2020 (MJSP, 2022). A PMMG delimita cota de 10% das vagas para ingresso de mulheres, o que pode, sem dúvidas, retardar a mudança cultural no que se refere à adaptação da população quanto às mulheres trabalhadoras no campo da segurança. As policiais ainda convivem com a subjugação e o desrespeito, que tendem a diminuir à medida que mais mulheres assumem funções de liderança. O processo seletivo da corporação está em curso e admitirá mais mulheres na PMMG ainda no ano de 2023.

Ao final do certame, ingressarão mulheres que marcarão novas quebras de paradigmas e serão exemplos importantes para outras que ainda ocuparão tais espaços. Permito-me citar algumas pioneiras que conheci durante minha trajetória, também bastante marcante pelo protagonismo em determinadas áreas, especialmente, na conciliação entre o campo acadêmico e a experiência profissional.

1. ILMARA, de soldado a Tenente, cumpriu seus trinta anos na corporação, sendo a primeira policial feminina natural de Teófilo Otoni a servir no município, enfrentando os obstáculos de um tempo (década de 1990), em que às mulheres policiais, não eram garantidos direitos que atualmente fazem jus.

2. Schirley ingressou como soldado e atualmente está sargento, graduação que a oportunizou ter sido a primeira policial feminina da região a comandar um destacamento de polícia. A Sargento Schirley comandou no município de Pavão e há quem ainda lembra das suas atividades de destaque por lá.

3. VERÔNICA, iniciou sua carreira como Tenente e, recentemente, foi anunciada como a primeira policial feminina a comandar uma Companhia PM no município de Almenara, no Vale do Jequitinhonha.

4. Karine, como cabo, foi a pioneira de Itaipé, sob a condição mais complicada da corporação para o trabalho feminino: o operacional. Complicado em duplo sentido. Por um lado, por precisar superar seus limites físicos e de adaptação em jornadas diferentes ao longo do dia – mãe, estudante e trabalhadora. Por outro lado, o desafio de enfrentar preconceitos associados a posturas misóginas – ódio ou aversão às mulheres.

Afinal, há pessoas pouco ou nada acostumadas a receber ordens de mulheres, vê-las em posições de poder ou mesmo, intelectualmente independentes. Destaco algumas pioneiras para enfatizar quantas barreiras vistas com desimportância ainda precisam ser superadas para que não precisemos mais levantar assuntos como este em colunas de jornal com a finalidade principal de provocar a reflexão. Para evidenciar lacunas, abrir caminhos e legitimar suas capacidades, as mulheres precisarão ter, para além de coragem de apertar gatilhos e portar fuzis, a autenticidade própria daquelas que reconhecem, que ainda há muito o que se fazer. Tal qual demonstram as policiais militares Rejane, Luara ou Thaís; as civis Kátia, Priscila ou Grazielle; as penais, Virgínia, Ivone ou Sandra. Não há dúvidas de que cada uma delas, sob a diversidade de policiais que representam em suas respectivas categorias, têm histórias de singular significado e, certamente, inspiradoras.

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