Aniversário dos 56 anos de existência da Lei dos Crimes de Responsabilidade dos Prefeitos

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Existe o que comemorar?

Prof. Me. Jeferson Botelho
Professor de Direito Penal e Processo Penal
Delegado Geral de Polícia em Minas Gerais
Mestre em Ciências das Religiões pela Faculdade Unidas de Vitória-ES
Autor de obras jurídicas
Advogado em Minas Gerais
Membro da Academia de Letras de Teófilo Otoni/MG
Aniversariar é agregar experiência e maturidade; mais de meio século aprendendo com erros e acertos, com engodos e fraudes; um mundo de fantasias, de condutas engendradas, comportamento ardiloso, astucioso; condutas virtuosas ou desviantes; um cenário apropriado para produção de cinemas; talvez um filme de terror; o mais coerente seria reverter o presente de ouro para a sociedade; esse grande presente de todos os tempos, traduzido em combater incisivamente a corrupção e o nepotismo seria um sonho de consumo da sociedade brasileira. Combater o amadorismo e o apadrinhamento no setor público. Arrostar o cabotinismo narcisista na Administração Pública. Repudiar com veemência a nomeação de alguém para cargo público tão somente pela casca de um nome fantasioso, gabolice mendaz, bazófia ilusória, jactância exibitória ou sua capacidade de “venditor fumi”. Manter uma máquina administrativa de 5.570 prefeitos é algo surreal quando se pensa na quantidade e qualidade do gasto público. É preciso acordar do pesadelo e sonhar. Mas é preciso sonhar acordado porque assim podemos escolher a direção a ser tomada para se alcançar a concretude da liberdade, fraternidade e espírito altruísta de solidariedade social.

RESUMO: O presente texto tem por fim colimado analisar sem pretensão exauriente a dogmática dos crimes de responsabilidade dos prefeitos conforme comando normativo do Decreto-Lei nº 201, de 27 de fevereiro de 1967.

Palavras-Chave: Decreto-Lei 201/67; crimes; responsabilidade; prefeitos.

1. INTRODUÇÃO

A vida é mesmo surpreendente e imprevisível. Um misto de avanços, retrocessos, idas e chegadas, encantos, desencantos, um mar de emoções, frustrações, alegrias, um palco de acontecimentos, histórias, saudades, amores e paixões, mutações sociais de toda ordem. Mudam-se os costumes, atravessaram gerações, transformações sociais, tudo isso acontecendo numa velocidade incrível, deixando rastros de nostalgias de épocas que não votam mais; valores são arrebatados, gerando revolta e dor em determinadas pessoas que não se prepararam para as profundas transformações sociais.

Na gestão pública não é diferente; saímos de um modelo de Administração Pública patrimonialista, própria dos Estados absolutistas europeus do século XVIII, onde o aparelhamento estatal era a extensão do próprio poder do governante e os seus funcionários são considerados como membros da nobreza, onde os bens públicos e particulares se confundiam, trazendo como marca a corrupção e o nepotismo; logo depois passamos por uma Administração Pública burocrática, com sensíveis mutações no setor público, já com a presença de um leve sistema de controle; destarte, a administração pública burocrática surge para combater a corrupção e o nepotismo do modelo patrimonialista, introduzindo a impessoalidade, a hierarquia funcional e o formalismo exacerbado; em seguida deparamos com um modelo de Administração Pública gerencial, uma espécie de modelo da iniciativa privada, voltando os olhares para um Estado por resultados.

Atualmente, vivemos uma espécie de Nova Administração Pública, que visa atingir a plenitude do princípio da eficiência na prestação de serviços públicos, agora tudo conectado por meios tecnológicos visando atingir os objetivos sociais, sobretudo, com celeridade e rapidez, sem descuidar-se da eficiência.

É claro que o só exercício da atividade pública já tem o condão de gerar riscos de toda sorte para o gestor público e para a comunidade. Certamente, há um risco maior para quem exerce funções no Executivo, em quaisquer das esferas, uma vez que a prestação de serviços públicos deve alcançar com eficiência todos os direitos sociais, em especial, aqueles elencados no artigo 6º da Constituição da República de 1988, quais sejam, educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparado, um time de direitos sociais que devem ser garantidos pelo menos na sua versão de mínimo necessário para a sobrevivência.

Quando se aduz que a atividade pública é um risco, importa ressaltar que o gestor pode sacrificar a toda uma sociedade se não for detentor de habilidades necessárias para o desenvolvimento de seu mister, e assim, a depender do seu grau de omissão dolosa ou atuação com disposição a causar dolosa e diretamente um dano social, a sua conduta pode configurar crime de responsabilidade, cumulado com ato de improbidade administrativa, condutas previstas ou tipificadas na Carta Magna, no Código Penal ou em leis especiais, a exemplo do Decreto-Lei nº 201, de 67, objeto deste ensaio, ou até mesmo na Lei nº 8.429, de 92, que define os atos de improbidade administrativa, podendo ser Atos de Improbidade Administrativa que Importam Enriquecimento Ilícito, Atos de Improbidade Administrativa que Causam Prejuízo ao Erário e Atos de Improbidade Administrativa que Atentam Contra os Princípios da Administração Pública, notadamente, ação ou omissão dolosa que viole os deveres de honestidade, de imparcialidade e de legalidade.

Conforme se deflui, passaremos a tecer breves comentários acerca do Decreto-Lei nº 201, de 27 de fevereiro de 1967, como se afirmou em epígrafe, sem efeitos exaurientes.

2. ANIVERSÁRIO DOS 56 ANOS DO DECRETO-LEI Nº 201/67 E OS CRIMES DE RESPONSABILIDADE DOS PREFEITOS

De plano é relevante informar que o Decreto-Lei nº 201, de 67 entrou em vigor no dia 27 de fevereiro de 1967, sofrendo uma retificação em 14 de março de 1967. Assim, são 56 anos de existência.

Ao longo desse tempo, o Decreto-Lei passou por 05(cinco) modificações legislativas a fim de adaptar suas hipóteses à evolução e dinâmica da própria vida.

A primeira modificação do citado Decreto-Lei ocorreu por meio da Lei nº 5.659, de 1971 que previu a não aplicação do inciso III, do artigo 8º, às sessões extraordinárias que forem convocadas pelo Prefeito, durante os períodos de recesso das Câmaras Municipais. O dispositivo diz respeito às hipóteses de extinção do mandato do Vereador, assim declarado pelo Presidente da Câmara.

A segunda modificação do Decreto-Lei ocorreu com advento da Lei nº 6.793, de 13 de junho de 1980, que alterou justamente o inciso III, do artigo 8º, comentado acima, agora prevendo como causa de extinção do mandato do vereado, o fato de ele deixar de comparecer, em cada sessão legislativa anual, à terça parte das sessões ordinárias da Câmara Municipal, salvo por motivo de doença comprovada, licença ou missão autorizada pela edilidade; ou, ainda, deixar de comparecer a cinco sessões extraordinárias convocadas pelo prefeito, por escrito e mediante recibo de recebimento, para apreciação de matéria urgente, assegurada ampla defesa, em ambos os casos.

A terceira modificação se deu por intermédio da Lei nº   9.504, de 97, a famosa Lei das Eleições que revogou o § 2º, do artigo 7º, do Decreto em testilha, que diz respeito à cassação do mandato do vereador pela Câmara dos Vereadores.

O dispositivo revogado era assim redigido:

§ 2º O Presidente da Câmara poderá afastar de suas funções o Vereador acusado, desde que a denúncia seja recebida pela maioria absoluta dos membros da Câmara, convocando o respectivo suplente, até o julgamento final. O suplente convocado não intervirá nem votará nos atos do processo do substituído.   

Acontece, que o legislador desatento depois que revogou o § 2º do artigo 7º, deveria ter renomeado o parágrafo anterior, como parágrafo único, mesmo porque o artigo em apreço só tinha dois parágrafos. Agora temos o artigo 7º com o § 1º, sem o respectivo § 2º, o que contraria a Lei Complementar nº 95, de 98 que dispõe sobre a elaboração, a redação, a alteração e a consolidação das leis, conforme determina o parágrafo único do art. 59 da Constituição Federal, e estabelece normas para a consolidação dos atos normativos que menciona.

Por sua vez, a quarta modificação ocorreu por meio da Lei nº 11.966, de 2009, que deu nova redação ao inciso III, do artigo 5º do Decreto que diz respeito ao processo de cassação do mandato do Prefeito pela Câmara, por infrações definidas no referido comando normativo. Assim, o inciso determina que concluída a instrução, será aberta vista do processo ao denunciado, para razões escritas, no prazo de 5 (cinco) dias, e, após, a Comissão processante emitirá parecer final, pela procedência ou improcedência da acusação, e solicitará ao Presidente da Câmara a convocação de sessão para julgamento. Na sessão de julgamento, serão lidas as peças requeridas por qualquer dos Vereadores e pelos denunciados, e, a seguir, os que desejarem poderão manifestar-se verbalmente, pelo tempo máximo de 15 (quinze) minutos cada um, e, ao final, o denunciado, ou seu procurador, terá o prazo máximo de 2 (duas) horas para produzir sua defesa oral.    

A quinta e última mudança do Decreto-Lei 201, de 67, ocorreu com o advento da Lei nº 10.028, de 2000, que também alterou o Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal e a Lei no 1.079, de 10 de abril de 1950. Assim, a nova lei 10.028, de 2000 criou o Capítulo IV, do Título XI, do Código Penal para instituir os crimes contra as finanças públicas, artigo 359-A usque 359-H do CP.

A presente lei inseriu novas condutas criminosas praticadas por prefeitos no artigo 1º, do Decreto-Lei nº 201, de 76. Originariamente, o comando normativo previa 15 (quinze) modalidades de delito praticados por prefeitos, tendo sido criadas mais 08 (oito) condutas criminosas, perfazendo doravante 23(vinte e três) crimes. As últimas condutas delituosas que podem ser praticadas por prefeitos são:

XVI – deixar de ordenar a redução do montante da dívida consolidada, nos prazos estabelecidos em lei, quando o montante ultrapassar o valor resultante da aplicação do limite máximo fixado pelo Senado Federal;

XVII – ordenar ou autorizar a abertura de crédito em desacordo com os limites estabelecidos pelo Senado Federal, sem fundamento na lei orçamentária ou na de crédito adicional ou com inobservância de prescrição legal;

XVIII – deixar de promover ou de ordenar, na forma da lei, o cancelamento, a amortização ou a constituição de reserva para anular os efeitos de operação de crédito realizada com inobservância de limite, condição ou montante estabelecido em lei;

XIX – deixar de promover ou de ordenar a liquidação integral de operação de crédito por antecipação de receita orçamentária, inclusive os respectivos juros e demais encargos, até o encerramento do exercício financeiro;

XX – ordenar ou autorizar, em desacordo com a lei, a realização de operação de crédito com qualquer um dos demais entes da Federação, inclusive suas entidades da administração indireta, ainda que na forma de novação, refinanciamento ou postergação de dívida contraída anteriormente;

XXI – captar recursos a título de antecipação de receita de tributo ou contribuição cujo fato gerador ainda não tenha ocorrido;

XXII – ordenar ou autorizar a destinação de recursos provenientes da emissão de títulos para finalidade diversa da prevista na lei que a autorizou;

XXIII – realizar ou receber transferência voluntária em desacordo com limite ou condição estabelecida em lei.

Importante salientar que das 23 condutas criminosas, todas de ação pública incondicionada, apenas duas são puníveis com pena de reclusão, de dois a doze anos; as demais são penalizadas com detenção, de três meses a três anos. As duas condutas puníveis com reclusão são as previstas no artigo 1º, incisos I e II, do Decreto-Lei nº 201, de 1967, a saber:

I – apropriar-se de bens ou rendas públicas, ou desviá-los em proveito próprio ou alheio;

Il – utilizar-se, indevidamente, em proveito próprio ou alheio, de bens, rendas ou serviços públicos.

Claramente percebe que o inciso I, se assemelha ao crime de peculato previsto no artigo 312 do Código Penal, inclusive com penas idênticas, reclusão de 02 a 12 anos. A única diferença é que para o crime de peculato, o preceito secundário prevê pena de multa, aplicada cumulativamente com a pena privativa de liberdade.

O inciso II, estabelece uma espécie de peculato-uso praticado pelo Prefeito que venha a fazer uso indevidamente, em proveito próprio ou alheio, de bens, rendas ou serviços públicos.

A condenação definitiva em qualquer dos 23 (vinte e três) definidos no artigo 1º do Decreto-Lei nº 201, de 67, acarreta a perda de cargo e a inabilitação, pelo prazo de cinco anos, para o exercício de cargo ou função pública, eletivo ou de nomeação, sem prejuízo da reparação civil do dano causado ao patrimônio público ou particular.

Importante questão é em torno da competência para o processo e julgamento do Prefeito, que muito embota tenha rito previsto no Decreto-Lei nº 201, de 67, a partir do artigo 2º, a Constituição da República de 1988, define o julgamento do Prefeito perante o Tribunal de Justiça, artigo 29, X, CF/88.

Tratando-se de crimes eleitorais, crimes políticos e crimes praticados em detrimento de bens, serviços ou interesses da União, ou suas entidades autárquicas ou empresas públicas, a competência é da Justiça Federal (TRE e TRF).

Vale ressaltar o disposto na Súmula 702 do STF: “A competência do Tribunal de Justiça para julgar Prefeitos restringe-se aos crimes de competência da Justiça comum estadual; nos demais casos, a competência originária caberá ao respectivo tribunal de segundo grau”.

Sobre concurso de pessoas na prática de crimes de responsabilidade de Prefeitos, a lição de ANDREUCCI esclarece com profunda nitidez esta questão ao ensinar:

Outrossim, pode ocorrer que o prefeito municipal pratique crime comum ou de responsabilidade em concurso com pessoa que não ostente essa condição. Nesse caso, tratando-se de crime de responsabilidade tipificado no art. 1º do decreto-lei em análise, a qualidade de prefeito municipal constitui elementar do tipo, condição essa que se comunica ao coautor ou partícipe, que também responderá pelo crime funcional. No que tange à competência, nesse caso, será do Tribunal de Justiça, pois há continência (art. 77, I, do CPP), o que implica a unidade de processo e julgamento. No concurso de jurisdições de diversas categorias, predominará a de maior graduação (art. 78, III, do CPP), salvo nos crimes dolosos contra a vida. A propósito, o teor da Súmula 704 do STF: “Não viola as garantias do juiz natural, da ampla defesa e do devido processo legal a atração por continência ou conexão do processo do corréu ao foro por prerrogativa de função de um dos denunciados”. Entretanto, o STF, em diversos precedentes, tem entendido que, havendo detentores e não detentores de prerrogativa de foro acusados no mesmo processo, o desmembramento do processo deve ser a regra, ressalvadas hipóteses excepcionais a exigirem julgamento conjunto. Assim, de acordo com o STF, cabe apenas ao próprio tribunal ao qual toca o foro por prerrogativa de função promover, sempre que possível, o desmembramento de inquérito e peças de investigação correspondentes, para manter sob sua jurisdição, em regra, apenas o que envolva autoridade com prerrogativa de foro, segundo as circunstâncias de cada caso, ressalvadas as situações em que os fatos se revelem de tal forma imbricados que a cisão por si só implique prejuízo a seu esclarecimento.[1]

[1] ANDREUCCI. Ricardo Antônio. Crimes de Responsabilidade de Prefeitos. Disponível em https://emporiododireito.com.br/leitura/crimes-de-responsabilidade-de-prefeitos. Acesso em 07 de fevereiro de 2023.

O festejado professor ainda enfrenta a questão acerca da competência para o processo e julgamento do Prefeito ao término do mandato.

Se o prefeito municipal pratica a infração penal antes de ser eleito, quando assume o cargo ganha prerrogativa de função. Caso expire o tempo do mandato sem pronunciamento definitivo do Tribunal, a ação penal retornará à primeira instância. Pelo entendimento anterior, assentado na Súmula 394 do STF, se o prefeito municipal cometesse o crime no exercício do cargo, ainda que terminasse o mandato, continuaria a ter direito ao foro privilegiado. Mas isso não mais ocorre, tendo sido a referida súmula cancelada pelo STF. Na oportunidade do cancelamento, o STF, por unanimidade, entendeu que art. 102, I, b, da CF – que estabelece a competência do STF para processar e julgar originariamente, nas infrações penais comuns, o Presidente da República, o Vice-Presidente, os membros do Congresso Nacional, seus próprios Ministros e o Procurador-Geral da República – não alcança aquelas pessoas que não mais exercem mandato ou cargo. Assim, também no caso de prefeito municipal, a perda do mandato eletivo faz cessar a competência penal originária do Tribunal.[2]

[2] ANDREUCCI. (2019)

REFLEXÕES FINAIS

Como se disse, este ensaio se presta a tecer breves comentários acerca do 56º aniversário do Decreto-Lei 201, de 67. Logo se torna importante salientar que o citado comando normativo descreve sobre a responsabilidade dos Prefeitos e Vereadores.

Entretanto, as condutas criminosas que geram responsabilidade penal, artigo 1º, inciso I usque XXIII, se referem tão somente a prefeitos, que estão sujeitos ao julgamento do Poder Judiciário, independentemente do pronunciamento da Câmara dos Vereadores.

Sobre a competência para o processo e julgamento dos prefeitos, existem várias matérias já sumuladas pelos Tribunais Superiores. Assim, as Súmulas 208 e 209 do STJ definem respectivamente, que compete à Justiça Federal processar e julgar prefeito municipal por desvio de verba sujeita a prestação de contas perante órgão federal e, compete à Justiça Estadual processar e julgar prefeito por desvio de verba transferida e incorporada ao patrimônio municipal.

Outras duas Súmulas são de importância para o tema em apreço. Assim, a Súmula 703-STF define que a extinção do mandato do Prefeito não impede a instauração de processo pela prática dos crimes previstos no art. 1º do DL 201/67.  Por sua vez, no nesse sentido, a Súmula 164-STJ, estatui que o prefeito municipal, após a extinção do mandato, continua sujeito a processo por crime previsto no art. 1º do Dec. Lei nº 201, de 27/02/67.

Faz-se mister que a Súmula Vinculante 46 do STF estatui que a definição dos crimes de responsabilidade e o estabelecimento das respectivas normas de processo e julgamento são de competência legislativa privativa da União.

É correto afirmar, sem margens de erro, que o prefeito municipal é um grande empregado do povo. Ele recebe salários e outras gratificações, adicionais; é investido no poder de mando para cumprir bem as suas funções, agir com lealdade e transparência. Recebe a delegação popular para agir corretamente, fazer somente o certo, distanciar-se do errado. E para cumprir as suas funções, o Prefeito recebe o rótulo de agente público, com todas os riscos administrativos, para agir em conformidade com a lei; deve fazer somente aquilo que a lei determina, doutrinariamente chamado de legalidade estrita; deve se esmerar nas suas tarefas, cumprir suas funções com presteza, dedicação e competência. Não pode apropriar-se de bens ou rendas públicas, ou desviá-los em proveito próprio ou alheio. Não pode utilizar-se, indevidamente, em proveito próprio ou alheio, de bens, rendas ou serviços públicos.

Como servidor público, com todas as limitações legais, em especial, da Lei de Improbidade Administrativa, torna-se humanamente impossível um prefeito ficar rico, adquirir riquezas desproporcionais tão somente e unicamente com o salário que percebe. E nesse sentido, o artigo 9º, inciso VII, da Lei de Improbidade Administrativa qualifica como ímproba a aquisição de bens de qualquer natureza, no exercício de mandato, cargo, emprego ou função pública, cujo valor seja desproporcional à evolução patrimonial ou à renda do agente público.

E para celebrar o aniversário dos 56 anos de existência é mister reforçar o sentido democrático e do sistema de Estado de Direito, devendo qualquer cidadão ser o censor do povo na fiscalização das ações do prefeito, não permitir que o prefeito faça propaganda pessoal das atuações públicas, das ações e serviços públicos, porque isso ofende gravemente o princípio da impessoalidade previsto no artigo 37 da Carta Magna de 1988; exercer rigorosa fiscalização para que o prefeito não venha adquirir bens de valores desproporcionais do seu vencimento e os transfira fraudulentamente para nomes de terceiros, porque isso pode configurar lavagem de dinheiro punível pela Lei nº 9.613, de 98. 

Como presente de aniversário dos 56 anos de existência da norma reitora, não custa nada sonhar com dias melhores, talvez não fosse uma quimera, uma utopia, mas o povo brasileiro deveria ganhar de presente uma nova e significativa mudança legislativa denominada Lei da Solidariedade Humana para determinar que o exercente de mandato de Prefeito ou de outro cargo político qualquer deveria ser considerado um múnus público, portanto, voluntário, gratuito e sentido de doação; nunca uma profissão, mas um serviço público prestado em nome do exercício da cidadania.

Por fim, aniversariar é agregar experiência e maturidade; mais de meio século aprendendo com erros e acertos, com engodos e fraudes; um mundo de fantasias, de condutas engendradas, comportamento ardiloso, astucioso; condutas virtuosas ou desviantes; um cenário apropriado para produção de cinemas; talvez um filme de terror; o mais coerente seria reverter o presente de ouro para a sociedade; esse grande presente de todos os tempos, traduzido em combater incisivamente a corrupção e o nepotismo seria um sonho de consumo da sociedade brasileira. Combater o amadorismo e o apadrinhamento no setor público. Arrostar o cabotinismo narcisista na Administração Pública. Repudiar com veemência a nomeação de alguém para cargo público tão somente pela casca de um nome fantasioso, gabolice mendaz, bazófia ilusória, jactância exibitória ou sua capacidade de “venditor fumi”. Manter uma máquina administrativa de 5.570 prefeitos é algo surreal quando se pensa na quantidade e qualidade do gasto público. É preciso acordar do pesadelo e sonhar. Mas é preciso sonhar acordado porque assim podemos escolher a direção a ser tomada para se alcançar a concretude da liberdade, fraternidade e espírito altruísta de solidariedade social.

REFERÊNCIAS

ANDREUCCI. Ricardo Antônio. Crimes de Responsabilidade de Prefeitos. Disponível em https://emporiododireito.com.br/leitura/crimes-de-responsabilidade-de-prefeitos. Acesso em 07 de fevereiro de 2023.

BRASIL. Constituição da República de 1988. Disponível em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm. Acesso em 07 de fevereiro de 2023.

BRASIL. Código Penal Brasileiro. Disponível em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm. Acesso em 07 de fevereiro de 2023.

BRASIL. Decreto-Lei nº 201, de 27 de fevereiro de 1967. Disponível em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del0201.htm. Acesso em 07 de fevereiro de 2023.

BRASIL. Lei de Improbidade Administrativa. Disponível em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8429.htm. Acesso em 07 de fevereiro de 2023.

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