Furacão Covid: um ano de convivência com o desconhecido

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Juliana Lemes da Cruz.
Doutoranda em Política Social – UFF.
Pesquisadora GEPAF/UFVJM.
Coordenadora do Projeto MLV.
Contato: julianalemes@id.uff.br

A pandemia do novo coronavírus completou um ano de chegada ao Brasil com a marca de quase 300 mil mortes. Antes do final do mês de março de 2021, já contabilizamos em 24 horas, mais de 3.000 (três mil) óbitos por complicações decorrentes da COVID-19. Os hospitais superlotados nas capitais e municípios de médio e grande porte já anunciam o que aguarda o interior do país. Soma-se à turbulência dessa crise, a desinformação do conjunto expressivo da população, a dificuldade em fazer a leitura crítica da realidade e, por vezes, a má fé daqueles que enxergam na pandemia, uma singular oportunidade de tirar vantagens particulares. Dentre tantos elementos, destaco alguns.

1. FALTA DE AÇÕES COORDENADAS PELO PODER CENTRAL – Na contramão do que recomenda as agências globais de saúde, o presidente do Brasil, Jair Messias Bolsonaro, abertamente, desprezou a potência do vírus, negligenciando a pandemia de uma forma pouco vista dentre os chefes de estado de todo o mundo. Sua atitude influenciou de forma preocupante parcela expressiva da população e também, as ações de alguns governos municipais e estaduais. Em meio aos desencontros, à falta de uma campanha unificada de informação em nível nacional e protocolos para atendimento da demanda, o Ministério da Saúde trocou de direção por quatro vezes. Primeiro, Luiz Henrique Mandetta (01/jan/19 até 16/abr/20). Em seguida, Nelson Taich (17/abr/20 até 15/mai/20). Por um tempo mais prolongado, Eduardo Pazzuello (02/jun/20 até 23/mar/21) e em 23 de março, assumiu Marcelo Queiroga.

Posicionamentos claros e ações direcionadas para prevenção da disseminação da doença não são as marcas do Ministério da Saúde diante da grave crise sanitária que se agrava a cada dia. Inúmeros episódios, dentre os quais, o vencimento de insumos que ficaram por meses armazenados em um depósito; a imprevisibilidade na aquisição de seringas e materiais de uso restrito dos profissionais de saúde; a ingerência na condução da crise do oxigênio para as unidades de saúde em Manaus e depois, em todo o país; e o atraso na contratação de doses das vacinas precocemente anunciadas por laboratórios estrangeiros, ajudaram a consolidar o atual cenário de colapso do Sistema de Saúde.

2. GUERRA ENTRE TRÊS PODERES – CRISE POLÍTICA – Como se não bastasse, as tensões por conta das eleições municipais evidenciaram uma verdadeira guerra política em torno da situação calamitosa vivenciada pelos brasileiros. Os entraves envolvem atores políticos do executivo de vários cantos do país, do legislativo e também do judiciário. Os três poderes em pé de guerra, a farra desordenada dos decretos, a judicialização da vida, a população desinformada sob a mira das fake news e a Covid-19 à solta em franco ataque ao Sistema Único de Saúde. De modo desorientado, em virtude da ausência de protocolos, pacientes são tratados de forma reativa e isolada.

3. AUXÍLIO EMERGENCIAL – Em razão da necessidade de isolamento social, comprometendo as atividades laborais, as pressões foram potencializadas sobre o poder central. Para cerca de 60 milhões de brasileiros, o governo federal, em acordo com o congresso nacional, conferiu o auxílio emergencial por alguns meses. Esta política de transferência de renda movimentou a economia do país e pela primeira vez em anos, muitas famílias saíram da condição extrema de pobreza. O auxílio findou em dezembro de 2020. Desde então, a crise sanitária e humanitária se aprofunda. Repercussões políticas sérias tocaram o sino de alerta das autoridades. O Brasil entrou em 2021 como uma ameaça em escala global, tanto pelo surgimento de uma nova variante do vírus em Manaus, quanto pela condução desastrosa da pandemia no país.

4. TRATAMENTO PRECOCE E VACINAS – Diante das incertezas sobre a doença, grupos de médicos decidiram pelo tratamento precoce com a utilização de alguns medicamentos, o chamado “kit covid”. Amplamente difundidos na mídia e defendidos, inclusive, pelos chefes de estado do Brasil e dos Estados Unidos (Donald Trump), o uso de alguns medicamentos sem comprovação científica de eficácia sobre a doença, dividiu por muito tempo opiniões. Hoje, a comunidade científica já atesta a ineficácia do uso do “kit covid” para tratamento da doença e ainda alerta a população para os graves riscos em razão do uso inadequado dos medicamentos que já levaram pessoas à fila de transplante de fígado. (Imagem: Charge do Lute – 17/03/2021 – Hoje em Dia).

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