A decisão do STF atende aos anseios da sociedade?
A droga é um câncer social que destrói, aniquila, inunda e transborda de sequelas seus consumidores, mergulhando as famílias de dependentes químicos em graves crises de toda ordem. É algo que assusta e desafia a humanidade. Perigo iminente para as atuais e futuras gerações. A droga é um mal que necessita de políticas públicas para vencê-lo. (Tráfico e Uso Ilícitos de Drogas. Atividade Sindical Complexa e ameaça transnacional do Prof. Jeferson Botelho)
Resumo: O presente texto tem por objetivo precípuo analisar sem pretensão exauriente a questão da descriminalização das drogas no Brasil e a recente decisão do STF em sede de Recurso Extraordinário.
Palavras-chave: Drogas; maconha; descriminalização; lei nº 11.343/2006; Supremo Tribunal Federal; recurso; extraordinário; decisão.
1. INTRODUÇÃO
A questão das drogas tem sido tema discutido no mundo; violência e flagelos sociais; ameaça à humanidade; a política de guerra contra as drogas, conflitos armados entre organizações criminosas e estado ortodoxo; promulgação de Convenções Internacionais, a exemplo do Decreto nº 154, de 26 de junho de 1991, contra o Tráfico Ilícito de Entorpecentes e Substâncias Psicotrópicas, exercendo o tráfico grave ameaça à saúde e ao bem-estar dos seres humanos e que têm efeitos nefastos sobre as bases econômicas, culturais e políticas da sociedade.
Mais que isso. A existência de vínculos que existem entre o tráfico ilícito e outras atividades criminosas organizadas, a ele relacionadas, que minam as economias lícitas de ameaçam a estabilidade, a segurança e a soberania dos Estados.
Reconhece-se a necessidade de fortalecer e complementar as medidas previstas na Convenção Única de 1961 sobre Entorpecentes, emendada pelo Protocolo de 1972 de Modificação da Convenção Única sobre Entorpecentes, de 1961, e na Convenção sobre Substâncias Psicotrópicas de 1971, a fim de enfrentar a magnitude e a expansão do tráfico ilícito e suas graves consequências.
No Brasil, em especial, desde as Ordenações Filipinas no Título LXXXIX, segundo o qual, prescrevia que “ninguém tenha em sua casa rosalgar branco nem vermelho, nem amarelo, nem solimão, nem água dele, nem escamoneia, nem ópio, salvo se for Boticário examinado, e que tenha licença para ter Botica, e usar do Ofício. E qualquer outra pessoa que tiver em sua casa, alguma das ditas coisas para vender perca toda sua fazenda…”
As drogas, sejam lícitas ou ilícitas têm sido motivo de preocupação das famílias brasileiras, com sérias consequências para a saúde, segurança e crescimento social.
O Código penal de 1940 deu tratamento à matéria em seu artigo 281, rotulando os crimes contra a saúde pública; depois de três décadas, a Lei 6368/76 entra em cena para disciplinar o tema, criando distinções e tratamento jurídico nos artigos 12 e 16, respectivamente, tráfico ilícito e posse ilícita de drogas para uso pessoal.
Avançando no tratamento jurídico, eis que entra em vigor a Lei nº 10.409, de 11 de janeiro de 2002, que revogou a parte processual da lei 6368/76, ficando em vigor a parte penal que definia os tipos penais, já que a então nova ordem teve a parte definidora dos tipos vetada, ficando duas leis em vigor, convivendo simultaneamente.
As duas legislações em epígrafe foram revogadas expressamente com a entrada em vigor da Lei nº 11.343, de 2006, que instituiu o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas, prescreveu medidas para prevenção do uso indevido, atenção e reinserção social de usuários e dependentes de drogas; estabeleceu normas para repressão à produção não autorizada e ao tráfico ilícito de drogas e definiu os crimes, além de determinar outras providências no tocante ao assunto.
No tocante ao comércio ilícito de drogas a atual norma regente traz a conduta do tráfico em especial, no artigo 33, com 18(dezoito) verbos nucleares, com previsão de pena de reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa. Importante reproduzir as condutas principais e os tipos equiparados do artigo 33 da Lei nº 11.343, de 2006, in verbis:
Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar:
Pena – reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa.
§ 1º Nas mesmas penas incorre quem:
I – importa, exporta, remete, produz, fabrica, adquire, vende, expõe à venda, oferece, fornece, tem em depósito, transporta, traz consigo ou guarda, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, matéria-prima, insumo ou produto químico destinado à preparação de drogas;
II – semeia, cultiva ou faz a colheita, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, de plantas que se constituam em matéria-prima para a preparação de drogas;
III – utiliza local ou bem de qualquer natureza de que tem a propriedade, posse, administração, guarda ou vigilância, ou consente que outrem dele se utilize, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, para o tráfico ilícito de drogas.
IV – vende ou entrega drogas ou matéria-prima, insumo ou produto químico destinado à preparação de drogas, sem autorização ou em desacordo com a determinação legal ou regulamentar, a agente policial disfarçado, quando presentes elementos probatórios razoáveis de conduta criminal preexistente.
2. DA POSSE DE DROGAS PARA USO PESSOAL
A posse de drogas para uso pessoal reside toda a discussão em torno da decisão do STF sobre a descriminalização das drogas, ou especificamente em reação à maconha.
Antes continuar nas incursões jurídicas, relevante mencionar que as drogas proibidas no Brasil são aquelas previstas na Portaria nº 344, de 1998, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária.
A revogada Lei nº 6368, de 1976, tratava da posse de drogas ilícitas no artigo 16, conduta de ação múltipla, ou misto alternativo, consistente em adquirir, guardar ou trazer consigo, para o uso próprio, substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, pena de detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e pagamento de (vinte) a 50 (cinquenta) dias-multa.
No tocante à posse de drogas ilícitas para uso pessoal, o Código penal militar tem tratamento diverso da legislação comum. Assim, a legislação Castrense confere tratamento jurídico para as condutas de tráfico e uso de drogas no mesmo dispositivo, artigo 290 do CPM, conforme se segue:
Tráfico, posse ou uso de entorpecente ou substância de efeito similar
Art. 290. Receber, preparar, produzir, vender, fornecer, ainda que gratuitamente, ter em depósito, transportar, trazer consigo, ainda que para uso próprio, guardar, ministrar ou entregar de qualquer forma a consumo substância entorpecente, ou que determine dependência física ou psíquica, em lugar sujeito à administração militar, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar: Pena – reclusão, até cinco anos.
2.1 DA POSSE PARA USO PESSOAL DE DROGAS ILÍCITAS PREVISTA NA LEI Nº 11.343/2006
Revogada a Lei nº 6368, de 1976, o artigo 16 que tratava da conduta da posse de drogas ilícitas para uso pessoal deixa de existir para entrar em cena nova disciplina para o tema, agora com tratamento bem diferente a partir do artigo 28 da Lei nº 11.343/2006. Assim, a Lei em comento traz o Capítulo III, do Título III, as disposições referentes às condutas para consumo pessoal de drogas, sem autorização.
Logo no artigo 27, a lei determina que as penas previstas no Capítulo III poderão ser aplicadas isolada ou cumulativamente, bem como substituídas a qualquer tempo, ouvidos o Ministério Público e o defensor. O artigo 28 descreve a condutas e medidas cominadas, a saber:
Art. 28. Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas:
I – advertência sobre os efeitos das drogas;
II – prestação de serviços à comunidade;
III – medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo.
Relevante dispositivo é o previsto no § 2º do artigo 28, segundo o qual, para determinar se a droga se destinava a consumo pessoal, o juiz atenderá à natureza e à quantidade da substância apreendida, ao local e às condições em que se desenvolveu a ação, às circunstâncias sociais e pessoais, bem como à conduta e aos antecedentes do agente.
Para garantia do cumprimento das medidas educativas a que se refere o caput do artigo 28 em epígrafe, a que injustificadamente se recuse o agente, poderá o juiz submetê-lo, sucessivamente a admoestação verbal e multa, podendo ainda o juiz determinará ao Poder Público que coloque à disposição do infrator, gratuitamente, estabelecimento de saúde, preferencialmente ambulatorial, para tratamento especializado.
O autor que for localizado com drogas ilícitas, para uso pessoal, sem autorização, não poderá ser preciso em flagrante, conforme previsto no artigo 48, § 2º, da Lei nº 11.343/2006, a saber:
§ 2º Tratando-se da conduta prevista no art. 28 desta Lei, não se imporá prisão em flagrante, devendo o autor do fato ser imediatamente encaminhado ao juízo competente ou, na falta deste, assumir o compromisso de a ele comparecer, lavrando-se termo circunstanciado e providenciando-se as requisições dos exames e perícias necessários. (grifo nosso)
3. POSSE DE DROGAS ILÍCITAS PARA CONSUMO PRÓPRIO SEM AUTORIZAÇÃO É CRIME?
Em termos gerais, pode conceituar infração penal, como sendo toda conduta antissocial, típica, ilícita e culpável, prevista em lei, tendo como consequência a cominação de penas.
Pode-se perceber que o conceito acima é puramente jurídico, considerando que o Código penal pátrio não determina textualmente o que conceito de crime e nem de conduta contravencional, espécies de infração penal.
Não constante a omissão legislativa, tramita no Congresso Nacional o PLS nº 236, de 2012, que visa introduzir uma ampla reforma penal no Brasil. E justamente no artigo 14, existe a previsão de fato criminoso:
Art. 14. Do crime. O fato criminoso. A realização do fato criminoso exige ação ou omissão, dolosa ou culposa, que produza ofensa, potencial ou efetiva, a determinado bem jurídico. Parágrafo único. O resultado exigido somente é imputável a quem lhe der causa e se decorrer da criação ou incremento de risco tipicamente relevante, dentro do alcance do tipo.
Mais de uma década já se transcorreu e o PLS em comento ainda tramita no Congresso Nacional, sendo certo que a construção de um Código penal é extremamente demorada, notadamente, em relação a esse PLS que tem interesse de criar e introduzir no país o princípio da codificação, trazendo para o cerne do Código penal toda a legislação especial ou esparsa, a fim de se garantir a tão almejada segurança jurídica.
Não obstante a toda essa dificuldade na formulação do crime de crime no Brasil, encontra-se em pleno vigor o Decreto-Lei 3.914, de 09 de dezembro 1941, que nos apresenta importante conceito de crime e de contravenção em seu artigo 1º, in verbis:
Art. 1º Considera-se crime a infração penal que a lei comina pena de reclusão ou de detenção, quer isoladamente, quer alternativa ou cumulativamente com a pena de multa; contravenção, a infração penal a que a lei comina, isoladamente, pena de prisão simples ou de multa, ou ambas, alternativa ou cumulativamente.
Diante da definição do conceito de crime e contravenção fornecido pelo referido Decreto-Lei, a doutrina brasileira, encampada pelos brilhantes juristas Luiz Flávio Gomes e Rogério Sanches Cunha, passou a considerar a conduta a posse de drogas para uso pessoal sem autorização, é claro, como infração sui gêneris, a teor RE 430.105 – STF, que tratou da natureza jurídica da posse de drogas para consumo próprio do artigo 28, Lei nº 11.343/2006, conforme fragmentos abaixo:
Voto: Parte da doutrina tem sustentado que o art. 28 da Lei 11.343/06 aboliu o caráter criminoso da conduta anteriormente incriminada no art. 16 da Lei 6.368/76, consistente em “adquirir, guardar ou trazer consigo, para uso próprio, substância entorpecente ou que determine a dependência física ou psíquica, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar”. (…). A controvérsia foi bem exposta em artigo dos professores Luiz Flávio Gomes e Rogério Cunha Sanches (GOMES, Luiz Flávio; SANCHES, Rogério Cunha. “Posse de drogas para consumo pessoal: crime, infração penal ‘sui generis’ ou infração administrativa?”, disponível em: http://www.lfg.com.br. 12 dez. 2006), do qual extrato, verbis: h) o fato de a CF de 88 prever, em seu art. 5º, inc. XLVI, penas outras que não a de reclusão e detenção, as quais podem ser substitutivas ou principais (esse é o caso do art. 28) não conflita, ao contrário, reforça nossa tese de que o art. 28 é uma infração penal sui generis exatamente porque conta com penas alternativas distintas das de reclusão, detenção ou prisão simples. A todos os argumentos lembrados cabe ainda agregar um último: conceber o art. 28 como ‘crime’ significa qualificar o possuidor de droga para consumo pessoal como ‘criminoso’. Tudo que a nova lei não quer (em relação ao usuário) é precisamente isso. Pensar o contrário retrataria um grave retrocesso punitivista (ideologicamente incompatível com o novo texto legal). Em conclusão: a infração contemplada no art. 28 da Lei 11.343/2006 é penal e sui generis. Ao lado do crime e das contravenções agora temos que também admitir a existência de uma infração penal sui generis.” (…) Sepúlveda Pertence Relator[1]
4. PARÂMETROS PARA DISTINÇÕES ENTRE USO E TRAFICÂNCIA DE DROGAS
Na lei 6368/76, que vigorou por logo tempo no Brasil, os critérios eram mencionados no artigo 37, onde previa que para efeito de caracterização dos crimes definidos na lei em epígrafe a autoridade atenderá à natureza e à quantidade da substância apreendida, ao local e às condições em que se desenvolveu a ação criminosa, as circunstâncias da prisão, bem como à conduta e aos antecedentes do agente.
[1] Natureza jurídica da posse de drogas para consumo próprio (art. 28, Lei nº 11.343/2006). Disponível em https://ibccrim.org.br/noticias/exibir/4354/. Acesso em 25 de agosto de 2023, às 11h51min.
Por sua vez, a atual Lei nº 11.343, de 2006, em seu artigo 52, determina algumas medidas a serem adotadas pela autoridade policial ao remeter os autos do inquérito policial ao juízo, dentre as quais pode-se citar:
I – relatará sumariamente as circunstâncias do fato, justificando as razões que a levaram à classificação do delito, indicando a quantidade e natureza da substância ou do produto apreendido, o local e as condições em que se desenvolveu a ação criminosa, as circunstâncias da prisão, a conduta, a qualificação e os antecedentes do agente;
Acontece que agora nos votos dos ministros do STF no Recurso Especial que analisa a descriminalização da maconha em especial, alguns sugerem que quantidade de drogas como parâmetros de distinção entre posse para uso e exercício de traficância. Uns sugeriam até 25 gramas, outros sugeriam outros limites, como 60 gramas, 100 gramas, e tantos outros limites.
Esse critério objetivo fixado em parâmetros de qualidade não soluciona a questão. O que pode acontecer com esses parâmetros de qualidade é legitimar o traficante, porque se a quantidade for 100 gramas, evidentemente, que os traficantes vão vender de 100 em 100 gramas. O critério de quantidade pode ser importante, mas não resolve a questão. Imagina-se um contumaz traficante, que sabendo da quantidade estabelecida pela lei, instala um carrinho de venda de produtos em frente a uma escola para comercializar drogas.
Geralmente, os traficantes não carregam grandes quantidades de drogas para o comércio, isto para não aumentar seu prejuízo quando da abordagem dos policiais.
Assim, a quantidade é relevante para aferição da classificação do delito. Mas é preciso, sobretudo, analisar a natureza da droga. É maconha, Skank, haxixe? É cocaína, crack, merla? É um opioide? Trata-se de LSD, ecstasy, é da família do MDMA?
O local da prisão também é muito importante. Foi na entrada de uma escola, no momento do intervalo para recreio? Foi nas imediações de um presídio?
O autor do crime possui antecedentes policiais por tráfico de drogas? Já cumpriu pena? No momento da prisão, a Polícia apreendeu dinheiro trocado, apreendeu caderno com anotações da movimentação do tráfico? O autor do crime em pouco tempo ostentava riqueza desproporcional com sua atividade laborativa?
REFLEXÕES FINAIS
O Brasil tem vivido, infelizmente, o flagelo das drogas. Famílias destruídas, vidas perdidas, enfim, as drogas, com seu poder devastador, invadiram a nossa Nação. Essa, no entanto, não é somente uma realidade brasileira, pois o mundo, de uma forma geral, está perdendo a guerra contra talvez aquilo que pode ser considerado como o mal do século.
(Rogério Greco – Prefácio do Livro Tráfico e Uso Ilícitos de Drogas. Atividade Sindical Complexa e ameaça transnacional do Prof. Jeferson Botelho)
Diante do exposto, sem pretensão de esgotar um tema tão relevante para a sociedade brasileira, sobretudo, nas esferas da saúde e segurança públicas, a meu sentir não há a mínima necessidade de desperdício de fôlego e energia para se chegarem a determinadas conclusões.
E a primeira conclusão que se tem, numa interpretação lógico-sistemática é que a posse de drogas ilícitas para consumo próprio, sem autorização ou em desacordo com determinações legais, atualmente NÃO é considerada crime nem contravenção penal segundo a legislação brasileira, isto porque não há nenhuma possibilidade de prisão em flagrante nem há cominação de preceitos secundários de detenção, reclusão, prisão simples nem multa autônoma, a teor do artigo 32 do CP c/c artigo 5º do Decreto-Lei 3.688, de 1941.
A segunda conclusão dentro da hermenêutica lógica, é que a posse de drogas ilícitas para consumo próprio em autorização ou em desacordo com determinação legal CONTINUA sendo conduta PROIBIDA, sujeita às medidas impostas pelo artigo 28 da Lei nº 11.343/2006, a saber: advertência sobre os efeitos das drogas, prestação de serviços à comunidade e medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo, sendo rotulada de INFRAÇÃO PENAL SUI GÊNERIS.
Outra conclusão lógica é que não há que se falar em descriminalização de drogas acerca de uma conduta que não seja considerada CRIME nem CONTRAVENÇÃO PENAL pela legislação brasileira, e assim, a meu aviso, não se pode falar em objeto de discussão, a matéria suscitada no Recurso Extraordinário (RE) 635.659, que questiona a constitucionalidade do artigo 28 da Lei de Drogas (Lei 11.343/2006), ajuizada pela Defensoria de São Paulo, cuja ação argumenta que o dispositivo fere os direitos à liberdade, privacidade e autolesão, garantidos pela Constituição.
Outro fundamento relevante, respeitando pensamentos em contrário, é que não se pode afastar a conduta hoje proibida, mas atípica, de posse de drogas ilícitas para uso próprio, sob simples argumento de violação aos preceitos da liberdade, privacidade e autolesão. O que se pretende e se busca com toda tenacidade atualmente é viver numa sociedade próspera e harmoniosa, onde todos possam contribuir com sua saúde plena e participativa, sobretudo, com sua força laborativa para o crescimento socioeconômico do país, sendo do conhecimento geral que as drogas lícitas ou ilícitas provocam danos à saúde das pessoas conforme estudos científicos divulgados em fontes abertas, inclusive dependência física e psíquica, o que sem dúvidas influência negativamente no bem-estar social.
E desta forma, é mais benéfica proporcionalmente para a sociedade permanecer com a conduta de posse de drogas ilícitas, qualquer que seja a substância prevista na Portaria 344/98 da ANVISA, PROIBIDA e NÃO CRIMINOSA, que depois ter que enfrentar as novas dinâmicas das organizações criminosas, que passarão a atuar se valendo das falhas do Estado na política de combate às drogas, notadamente, no momento atual em que se destrói o conceito de crime permanente quando das abordagens policiais levadas a efeito em proteção da sociedade, com sério risco para a Segurança Pública, em especial, quando das ameaças de cometimento de crime de abuso de poder por parte de agentes policiais quando das grandes apreensões de drogas sem o mandado de busca e apreensão.
É preciso urgentemente assegurar a garantia dos Objetivos 3 e 16 da AGENDA 2030, cujo desiderato é de assegurar uma vida saudável e promover o bem-estar para todas e todos, em todas as idades, e promover sociedades pacíficas e inclusivas para o desenvolvimento sustentável, proporcionar o acesso à justiça para todos e construir instituições eficazes, responsáveis e inclusivas em todos os níveis.
Claramente, o assunto ligado às drogas, à política pública de combate à substância psicotrópica, visando a proteção social, dentro de uma lógica e matriz integral, é de transcendental importância. E desta forma, um tema tão importante para a sociedade não pode ser decidido por um time de onze pessoas, por melhores que sejam seus atletas, representando uma Nação inteira com mais de 207 milhões de pessoas, portanto, assunto que deve ser discutido na Casa do Povo, assim, no Congresso Nacional, ouvindo especialistas do assunto, auscultando a sociedade, cientistas, analisando possível liberação de alguns princípios ativos da canabis sativa, a exemplo do canabidiol, tão imprescindível para a saúde das pessoas em determinadas situações de doenças graves, com posições e balizamentos de cientistas com expertise no assunto, e somente assim, teremos uma sociedade mais próspera e fraterna. Ter notário saber jurídico é sempre importante, imprescindível para a promoção de direitos humanos, tudo isso para conduzir os destinos da Nação, nas trincheiras da paz, do amor supremo, do espírito humanista petrarquiano, mas ouvir especialistas e respeitar as normas de competência é bem melhor.
Arremata-se, para afirmar. A POSSE DE DROGAS PARA CONSUMO PRÓPRIO no Brasil hodiernamente não é crime; apenas conduta proibida. E assim, na lógica conclusiva, é correta a assertiva segundo a qual somente se DESCRIMINALIZA aquilo que é crime, caso contrário seria uma aberração hiperbólica excessiva e teratológica. Da mesma forma não se molha aquilo que está molhado. No mesmo sentido somente se desabrocham as flores que ainda não se abriram.
Assim, a política atual de enfrentamento às drogas é razoável, melhor que a decisão da Suprema Corte, notadamente, com as modificações promovidas pela Lei 13.840, de 2019, sobretudo, acerca da disciplina do Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas e as condições de atenção aos usuários ou dependentes de drogas e do tratamento, e ainda sobre o financiamento das políticas sobre drogas.
Enquanto se espera o mundo girar, com sua velocidade, uns triunfando como raios de luzes, velozes como relâmpagos, outros no tempo da tartaruga, seus hábitos consuetudinários, cada país seguindo sua direção, caminhos diversos, com mutações frenéticas, de acordo com sua cultura e seus valores, e por tudo isso devem-se acostumar com as novas tendências, de terpeno de cannabis, de sorvetes de maconha, de propulsão de ódio, de indústria do mal, de práticas deterioradas, de desejos exóticos, de promiscuidades absurdas, de narcisismo otimizado, uns países na contramão da história, geração da inteligência artificial, e assim caminha a humanidade, talvez com passos lentos de formiga e sem vontade.
Acelerado ou na lentidão, importa salientar que a constitucionalidade ou não do artigo 28 da Lei sobre Drogas claramente implica em reconhecer ou não a criação de tipos penais, matéria exclusivamente de reserva legal do Congresso Nacional, o que implica em grave ofensa ao princípio da legalidade, segundo o qual não haverá crime sem lei anterior que o defina nem pena sem prévia cominação legal, ou na formulação latina, NULLUM CRIMEN, NULLA POENA SINE PREVIA LEGE.
Decidindo acerca do presente caso, o STF com profundo respeito e máxima vênia, estaria legislando, e portanto, invadindo outra seara, acerca de extinção de tipos penais, embora havida hoje meramente como conduta proibida a posse de drogas para consumo próprio consoante as exposições anteriores, e mais que isso, estaria sim literalmente criando o tipo penal de tráfico ilícito de drogas quando se definem os parâmetros de quantidade de drogas para configuração do tráfico ilícito de drogas, 25 gramas, 60 gramas, 100 gramas, e assim, só se resta ao cerrar do ataúde o apelo moribundo de solicitar que pare o mundo que eu quero descer.
Pois bem astronauta, o que foi que te aborreceu aí em cima? Por aqui está muito difícil, a nossa ignorância é grande, estamos num bagaço, morrendo de cansaço, aqui é só solidão, ódio, mentira e ambição. A Terra é um planeta em extinção. E o poeta Gabriel Pensador continua a questionar:
“(…) Ah não, meu irmão qual é a tua?
Que bicho te mordeu aí na lua?
Fica por aí que é o melhor que cê faz
A vida por aqui ‘tá difícil demais
Aqui no mundo, o negócio ‘tá feio
‘Tá todo mundo feito cego em tiroteio
Olhando pro alto, procurando a salvação
Ou pelo menos uma orientação
Você já ‘tá perto de Deus, astronauta
Então, me promete
Que pergunta pra ele as respostas
De todas as perguntas e me manda pela internet (…)”[2]
E agora para sintetizar o enredo final deste ensaio, afirma-se que não sendo crime o porte de drogas para consumo próprio, qualquer droga prevista na Portaria 344, de 1998 da ANVISA, não somente a maconha, tem-se que a melhor interpretação da decisão do Colendo STF, seria em torno da DESPROIBIÇÃO do porte de maconha para consumo próprio. A meu sentir, não seria a melhor decisão para a política pública de enfrentamento e combate às drogas, diante de tudo que se argumentou alhures, respeita-se a decisão, é claro, mas com ela não concorda, em face da ilegitimidade ad causam da Suprema Corte em conhecer da matéria, ausente, portanto, uma das condições válidas para o exercício da ação.
[2] PENSADOR. Gabriel. Astronauta. Disponível em https://www.letras.mus.br/gabriel-pensador/65577/. Acesso em 26 de agosto de 2023, às 08h23min.
O futuro é logo ali, num sopro, uma nova autora, um novo dia, uma nova era de sonhos e realizações. Haverá uma sociedade mais próspera e saudável, ou se viverá uma época de recrudescimento da violência, um caos na saúde, um retrocesso social?
A história cobrará dos responsáveis pelos resultados desastrosos advindos da decisão ou serão efusivamente aplaudidos de pé em caso de acerto.
REFERÊNCIAS:
BRASIL. LEI SOBRE DROGAS. LEI 11.343/2006. Disponível em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11343.htm. Acesso em 25 de agosto de 2023.
BRASIL. LEI DAS CONTRAVENÇÕES PENAL. Disponível em https://legislacao.presidencia.gov.br/atos/?tipo=DEL&numero=3688&ano=1941&ato=8a50zYE5kMnRkTadb. Acesso em 25 de agosto de 2023.
BRASIL. DECRETO-LEI 3.914/41. Disponível em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3914.htm. Acesso em 25 de agosto de 2023.
BRASIL. ORDENAÇÕES FILIPINAS. Disponível em https://www.diariodasleis.com.br/tabelas/ordenacoes/1-274-103-1451-04-05-89.pdf. Acesso em 25 de agosto de 2023.
BRASIL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO – (RE) 635.659. Disponível em https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=4034145. Acesso em 25 de agosto de 2023.
BRASIL. CÓDIGO PENAL MILITAR. Disponível em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del1001.htm. Acesso em 25 de agosto de 2023.
PENSADOR. Gabriel. Astronauta. Disponível em https://www.letras.mus.br/gabriel-pensador/65577/. Acesso em 26 de agosto de 2023, às 08h23min.
PEREIRA. Jeferson Botelho. Tráfico e Uso Ilícitos de Drogas. Atividade Sindical Complexa e ameaça transnacional. Leme. J. H. Mizuno. 2012. 340p.