A liberdade e as exceções da prisão no Brasil

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Por Jeferson Botelho
Delegado Geral de Polícia – Aposentado. Prof. de Direito Penal e Processo Penal. Mestre em Ciência das Religiões pela Faculdade Unida de Vitória/ES. Especialização em Combate à corrupção, antiterrorismo e combate ao crime organizado pela Universidade de Salamanca – Espanha. Advogado. Autor de livros
O crime organizado tem desafiado as agências de Polícia e a estrutura do Estado Ortodoxo; execuções com tiros de fuzis a luz do dia em locais improváveis; leis fragilizadas e atores sociais exangues, sem força de reação; a sociedade refém dos narcotraficantes; um verdadeiro caos num País da impunidade; pare o mundo que eu quero descer; o sistema de persecução não protege; não cuida e nem inspira confiança. O crime se agiganta e o estado se encurta; insegurança, um sistema oneroso; atrofiado; um estado paralelo, com leis e códigos próprios; com cartilhas de normas de conduta à comunidade; julgamentos sumários, anunciando que todos devem lutar sempre pela PAZ, JUSTIÇA, LIBERDADE, IGUALDADE e UNIÃO, visando sempre o crescimento da organização, respeitando sempre a ética do crime.

Resumo: O presente texto tem por finalidade precípua apresentar sem pretensão exauriente os inúmeros benefícios processuais que possibilitam a concessão da liberdade ao delinquente em mais de 90% dos tipos penais previstos na legislação pátria, bem assim, as remotas possibilidades de encarceramentos no Brasil.

Palavras-chave: Direito penal; liberdade; prisões; exceções.

INTRODUÇÃO

A prisão e a liberdade são os temas mais comentados no meio social. Todos os dias os noticiários da imprensa anunciam em manchetes casos de crimes violentos, prisões e criminosos postos em liberdade. Assuntos que têm mexido com o sentimento da sociedade brasileira. Chama-se a atenção os crimes violentos noticiados todos os dias; homicídios cruéis, feminicídios, execuções sumárias realizadas com a utilizações de fuzis em pátios de aeroportos, casos de roubos a mão armada, extorsão mediante sequestro, estupros, assédios sexuais, crimes cibernéticos, abigeatos, golpes praticados por estelionatários, corrupções, concussões, prevaricações e condescendências no setor público, atuação das ações do novo cangaço, além de tantos outros.

Também faz muito barulho nas mídias as fugas cinematográficas de presos dos presídios, a superlotação prisional, os julgamentos de criminosos em tribunais de júri, os benefícios processuais concedidos a presos, e até a previsão de férias anuais para presos recolhidos em presídios de Minas Gerais, benefício concedido por meio do artigo 59 da Lei Estadual nº 11.404, de 1994.

No meio jurídico-acadêmico, estudiosos afirmam que a liberdade é a regra e que a prisão é a exceção. Legalmente, a possiblidade de uma pessoa ser presa no Brasil é por via da prisão em flagrante delito, ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária. Assim, diz o artigo 5º, inciso LXI, da Carta Marga, que ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei. Quanto à prisão civil, o artigo 5º, inciso LXVII, da CF/88, pontua que não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário infiel. Em relação à prisão do depositário infiel, a Súmula Vinculante 25 do STF, assegura que é ilícita a prisão civil de depositário infiel, qualquer que seja a modalidade do depósito.

Desta forma, somente existe prisão civil no Brasil, aquela resultante do débito alimentar. 

LIBERDADE NAS DELEGACIAS DE POLÍCIA

Existem duas possiblidades de um criminoso sair pelas portas da frente de uma Delegacia de Polícia, em casos de prisão em flagrante delito.

O primeiro caso é se o crime praticado for de menor potencial ofensivo, que de acordo com o artigo 61 da Lei nº 9.099, de 95, consideram-se infrações penais de menor potencial ofensivo, para os efeitos desta Lei, as contravenções penais e os crimes a que a lei comine pena máxima não superior a 2 (dois) anos, cumulada ou não com multa. Levantamentos heurísticos apontam que existem hoje no código penal 131 crimes qualificados como de menor potencial ofensivo. Ainda conforme o art. 69 do JEC, a autoridade policial que tomar conhecimento da ocorrência lavrará termo circunstanciado e o encaminhará imediatamente ao Juizado, com o autor do fato e a vítima, providenciando-se as requisições dos exames periciais necessários. Ao autor do fato que, após a lavratura do termo, for imediatamente encaminhado ao juizado ou assumir o compromisso de a ele comparecer, não se imporá prisão em flagrante, nem se exigirá fiança. Em caso de violência doméstica, o juiz poderá determinar, como medida de cautela, seu afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a vítima. 

O segundo caso de sair pelas portas da frente de uma Unidade Policial, é quando o crime praticado pelo criminoso for afiançável e o Delgado de Polícia competente para arbitrar o valor da fiança, o que vem disciplinado no artigo 322 do CPP, que aduz:

Art. 322.  A autoridade policial somente poderá conceder fiança nos casos de infração cuja pena privativa de liberdade máxima não seja superior a 4 (quatro) anos.           

Parágrafo único.  Nos demais casos, a fiança será requerida ao juiz, que decidirá em 48 (quarenta e oito) horas.   

Após levantamentos e pesquisas dos tipos penais do Código Penal, levados a efeito pelo Prof. Jeferson Botelho, foram detectados 77 casos de crimes com a possibilidade de concessão de fiança pelo Delegado de Polícia.

Destarte, Botelho, apresenta os seguintes casos com a possiblidade de fiança já em sede de Delegacia de Polícia:

1) Homicídio culposo – art. 121, § 3º, do CP;

2) Induzimento, instigação ou auxílio a suicídio ou a automutilação, artigo 122, § 2º;

3) Aborto provocado pela gestante ou com o seu consentimento – art. 124;

4) Aborto provocado por terceiros, artigo 126 do CP;

5) Perigo de contágio venéreo – art. 130, § 1º;

6) Perigo de contágio de moléstia grave – art. 131;

7) Abandono de incapaz – art. 133, caput;

8) expor ou abandonar recém-nascido, para ocultar desonra própria, artigo 134, § 1º, do CP;

9) Maus-tratos na forma qualificada – art. 136, § 1º;

10) Intimidação sistemática virtual (cyberbullying), artigo 146-A, parágrafo único, do CP;

11) Sequestro e Cárcere privado – art. 148 caput;

12) Invasão de dispositivo informático, artigo 154-A, do CP;

13) Furto simples – art. 155, caput;

14) Extorsão indireta – art. 160;

15) Supressão ou alteração de marca em animais – art. 162 do CP;

16) Dano qualificado – art. 163, Parágrafo único;

17) Apropriação indébita – art. 168, caput;

18) Duplicata simulada – art. 172;

19) Induzimento à especulação – art. 174;

20) Fraudes e abusos na fundação ou administração de sociedade por ações – art. 177;

21) Emissão irregular de conhecimento de depósito ou “warrant” – art. 178;

22) Receptação – art. 180, caput;

23) Violação de direito autoral – art. 184, §§ 1º e 3º, CP;

24) Invasão de estabelecimento industrial, comercial ou agrícola. Sabotagem – art. 202;

25) Aliciamento para o fim de emigração – art. 206;

26) Aliciamento de trabalhadores de um local para outro do território brasileiro – art. 207;

27) Violação de sepultura – art. 210;

28) Destruição, subtração ou ocultação de cadáver – art. 211;

29) Vilipêndio a cadáver – art. 212;

30) Satisfação de lascívia mediante presença de criança ou adolescente – art. 218-A;

31) Mediação para servir a lascívia de outrem, artigo 227 do CP;

32) Rufianismo, artigo 230 do CP;

33) Simulação de autoridade para celebração de casamento – art. 238;

34) Simulação de casamento – art. 239;

35) Abandono material – art. 244;

36) Entrega de filho menor a pessoa inidônea, artigo 245, § 1º do CP;

37) Explosão – art. 251, § 1º;

38) Uso de gás tóxico ou asfixiante – art. 252;

39) Perigo de inundação – art. 255;

40) Desabamento ou desmoronamento – 256;

41) Interrupção ou perturbação de serviço telegráfico ou telefônico – art. 266;

42) Falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais, na forma culposa – art. 273, § 2º;

43) Outras substâncias nocivas à saúde pública – art. 278;

44) Medicamento em desacordo com receita médica – art. 280;

45) Associação Criminosa – art. 288;

46) Falsificação de papéis públicos – art. 293, § 2º;

47) Petrechos de falsificação – art. 294;

48) Falsidade ideológica em documento particular – art. 299, se o documento for particular;

49) Falso reconhecimento de firma em documento particular – art. 300, em caso de documento particular;

50) Reprodução ou adulteração de selo ou peça filatélica – art. 303;

51) Falsificação do sinal empregado no contraste de metal precioso ou na fiscalização alfandegária, ou para outros fins – art. 306, parágrafo único;

52) Fraude de lei sobre estrangeiro – art. 309 e 310;

53) Fraudes em certames de interesse público, art. 311-A, do CP;

54) Peculato mediante erro de outrem – art. 313;

55) Extravio, sonegação ou inutilização de livro ou documento – art. 314;

56) Violência arbitrária, art. 322 do CP;

57) Abandono de função em faixa de fronteira – art. 323; parágrafo único;

58) Resistência qualificada – art. 329, § 1º;

59) Descaminho – art. 334;

60) Patrocínio de contratação indevida, art. 337-G, do CP;

61) Perturbação de processo licitatório, art. 337-I, do CP;      

62) Violação de sigilo em licitação, art. 337-J, do CP;    

63) Contratação inidônea, art. 337-M, do CP;       

64) Omissão grave de dado ou de informação por projetista, art. 337-O, do CP;       

65) Reingresso de estrangeiro expulso, art. 338 do CP;

66) Falso testemunho ou falsa perícia – arts. 342 e 343;

67) Coação no curso do processo – art. 344;

68) Fraude processual – art. 347, parágrafo único;

69) Fuga de pessoa presa ou submetida a medida de segurança – art. 351, § 3º;

70) Arrebatamento de preso – art. 353;

71) Patrocínio infiel – art. 355;

72) Sonegação de papel ou objeto de valor probatório, art. 356 do CP;

73) Assunção de obrigação no último ano do mandato ou legislatura – art. 359-C;

74) Ordenação de despesa não autorizada – art. 359-D;

75) Aumento de despesa total com pessoal no último ano do mandato ou legislatura – art. 359 –G;

76) Oferta pública ou colocação de títulos no mercado – art. 359 –H. 77) Espionagem, art. 359-K, § 3º, do CP.[1]

[1] BOTELHO. Jeferson. A concessão de fiança pelo delegado de Polícia. Disponível em Concessão de fiança pelo delegado de polícia – Jus.com.br | Jus Navigandi. Acesso em 08 de novembro de 2024.

DA LIBERDADE ANTES DO PROCESSO

O artigo 5º, inciso LXII, da Constituição da República de 1988, determina que a prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juiz competente e à família do preso ou à pessoa por ele indicada. O CPP, disciplinou esta comunicação imediata, estabelecendo que a prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juiz competente, ao Ministério Público e à família do preso ou à pessoa por ele indicada.

Em até 24 (vinte e quatro) horas após a realização da prisão, será encaminhado ao juiz competente o auto de prisão em flagrante e, caso o autuado não informe o nome de seu advogado, cópia integral para a Defensoria Pública.

No mesmo prazo, será entregue ao preso, mediante recibo, a nota de culpa, assinada pela autoridade, com o motivo da prisão, o nome do condutor e os das testemunhas.

Após receber o auto de prisão em flagrante, no prazo máximo de até 24 (vinte e quatro) horas após a realização da prisão, o juiz deverá promover audiência de custódia com a presença do acusado, seu advogado constituído ou membro da Defensoria Pública e o membro do Ministério Público, e, nessa audiência, o juiz deverá, fundamentadamente:      

I – Relaxar a prisão ilegal; ou       

II – Converter a prisão em flagrante em preventiva, quando presentes os requisitos constantes do art. 312 deste Código, e se revelarem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão; ou            

III – Conceder liberdade provisória, com ou sem fiança.

Se o juiz verificar, pelo auto de prisão em flagrante, que o agente praticou o fato em qualquer das condições de excludente de ilicitudes, poderá, fundamentadamente, conceder ao acusado liberdade provisória, mediante termo de comparecimento obrigatório a todos os atos processuais, sob pena de revogação. 

Se o juiz verificar que o agente é reincidente ou que integra organização criminosa armada ou milícia, ou que porta arma de fogo de uso restrito, deverá denegar a liberdade provisória, com ou sem medidas cautelares. Transcorridas 24 (vinte e quatro) horas após o decurso do prazo estabelecido, a não realização de audiência de custódia sem motivação idônea ensejará também a ilegalidade da prisão, a ser relaxada pela autoridade competente, sem prejuízo da possibilidade de imediata decretação de prisão preventiva.

Durante a realização da audiência de custódia, o juiz de direito poderá relaxar a prisão se esta for ilegal. Sendo legal a prisão, o juiz de direito possui duas opções. Pode decretar a conversão da prisão em flagrante em prisão preventiva, nos casos previstos em lei; não sendo caso de prisão preventiva, resta ao magistrado, aplicar as medidas cautelares diversas da prisão, ou seja, aquelas previstas no artigo 319 do CPP, a saber:

Art. 319.  São medidas cautelares diversas da prisão:            

I – Comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo juiz, para informar e justificar atividades;            

II – Proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações;         

III – Proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela permanecer distante;         

IV – Proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja conveniente ou necessária para a investigação ou instrução;         

V – Recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos;         

VI – Suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais;         

VII – Internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes praticados com violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem ser inimputável ou semi-imputável (art. 26 do Código Penal) e houver risco de reiteração;              

VIII – Fiança, nas infrações que a admitem, para assegurar o comparecimento a atos do processo, evitar a obstrução do seu andamento ou em caso de resistência injustificada à ordem judicial;           

IX – Monitoração eletrônica.            

Ainda antes de começar o processo judicial, com todas as suas fases, instrução e julgamento, ainda são possíveis mais três possiblidades legais:

I – Transação penal, artigo 76, da Lei nº 9.099, de 1995, para os casos de crimes de menor potencial ofensivo;

II – Suspensão condicional do processo, artigo 89 da Lei nº 9.099, de 1995, nos crimes de médio potencial ofensivo, sujo dispositivo citado, recomenda que nos crimes em que a pena mínima cominada for igual ou inferior a um ano, abrangidas ou não por esta Lei, o Ministério Público, ao oferecer a denúncia, poderá propor a suspensão do processo, por dois a quatro anos, desde que o acusado não esteja sendo processado ou não tenha sido condenado por outro crime, presentes os demais requisitos que autorizariam a suspensão condicional da pena.

III – Acordo de não persecução criminal, artigo 28-A, do CPP, que aduz:

Art. 28-A. Não sendo caso de arquivamento e tendo o investigado confessado formal e circunstancialmente a prática de infração penal sem violência ou grave ameaça e com pena mínima inferior a 4 (quatro) anos, o Ministério Público poderá propor acordo de não persecução penal, desde que necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime, mediante as seguintes condições ajustadas cumulativa e alternativamente:        

I – Reparar o dano ou restituir a coisa à vítima, exceto na impossibilidade de fazê-lo;     

II – Renunciar voluntariamente a bens e direitos indicados pelo Ministério Público como instrumentos, produto ou proveito do crime;     

III – Prestar serviço à comunidade ou a entidades públicas por período correspondente à pena mínima cominada ao delito diminuída de um a dois terços, em local a ser indicado pelo juízo da execução, na forma do art. 46 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal);         

IV – Pagar prestação pecuniária, a ser estipulada nos termos do art. 45 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código penal) a entidade pública ou de interesse social, a ser indicada pelo juízo da execução, que tenha, preferencialmente, como função proteger bens jurídicos iguais ou semelhantes aos aparentemente lesados pelo delito; ou      

V – Cumprir, por prazo determinado, outra condição indicada pelo Ministério Público, desde que proporcional e compatível com a infração penal imputada.  

LIBERDADE NO PROCESSO CONDENATÓRIO

O condenado pode evitar uma prisão, mesmo tendo sido condenado por meio de uma sentença penal, em pelo menos em duas situações:

I – O primeiro caso é a chamada suspensão condicional da pena, mais conhecido por sursis. Assim, o artigo 77 do CP, determina que a execução da pena privativa de liberdade, não superior a 2 (dois) anos, poderá ser suspensa, por 2 (dois) a 4 (quatro) anos, desde que:        

I – O condenado não seja reincidente em crime doloso;         

II – A culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias autorizem a concessão do benefício;        

III – Não seja indicada ou cabível a substituição prevista no art. 44 deste Código.         

Ainda nesse mesmo dispositivo, existe a possibilidade do sursis, etário e o humanitário, onde a execução da pena privativa de liberdade, não superior a quatro anos, poderá ser suspensa, por quatro a seis anos, desde que o condenado seja maior de setenta anos de idade, ou razões de saúde justifiquem a suspensão.

II – O segundo é na substituição da pena privativa de liberdade por pena restritiva de direitos, nos casos presos a partir do artigo 43 do CP.

De início, relevante citar as penas restritivas de direito, Assim, as penas restritivas de direitos são:

I – Prestação pecuniária; 

II – Perda de bens e valores;

III – limitação de fim de semana;

IV – Prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas;

V – Interdição temporária de direitos;

VI – Limitação de fim de semana.

As penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade, quando: 

I – Aplicada pena privativa de liberdade não superior a quatro anos e o crime não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa ou, qualquer que seja a pena aplicada, se o crime for culposo;

II – O réu não for reincidente em crime doloso; 

III – A culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição seja suficiente. 

DO RECOLHIMENTO AO CÁRCERE

Se a sentença penal condenatória for superior a 04 anos de prisão, e se o crime for praticado com violência ou grave ameaça a pessoa, é possível o início de cumprimento da pena em sistema prisional, conforme o entendimento do artigo 33 do Código Penal.

Assim, a pena de reclusão deve ser cumprida em regime fechado, semiaberto ou aberto. A de detenção, em regime semiaberto, ou aberto, salvo necessidade de transferência a regime fechado. 

Considera-se: 

a) Regime fechado a execução da pena em estabelecimento de segurança máxima ou média;

b) Regime semiaberto a execução da pena em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar;

c) Regime aberto a execução da pena em casa de albergado ou estabelecimento adequado.

DOS BENEFÍCIOS PROCESSUAIS

A Lei penal e a Lei de Execuções penais descrevem inúmeros benefícios processuais ao longo do cumprimento de pena, a depender com mérito comportamental do apenado no interior do cárcere, conforme se pode verificar nos tópicos a seguir.

DOS SISTEMAS PENITENCIÁRIOS

A doutrina mais autorizada costuma citar três importantes sistemas de cumprimento de pena, a saber: Sistema Pensilvânico, Alburniano e Progressivo. Com autoridade, ensina SANTOS, QUE após a condenação, dá-se início ao cumprimento da pena imposta. Basicamente, existem três modelos de sistemas penitenciários, sendo o pensilvânico ou celular, o alburniano e o progressivo.[2] O autor segue discorrendo sobre o assunto em tela, com a menção de personalidades do assunto. O sistema pensilvânico ou celular surgiu no final do século XVIII, caracterizando-se pelo isolamento absoluto dos reclusos entre si e com o mundo exterior. O escopo era promover o arrependimento moral do apenado por meio da meditação, do silêncio e do isolamento, como forma de evitar a propagação de ideias ilícitas entre os presos[3]

Em seguida, surgiu o sistema auburniano, que deriva do nome da cidade de Auburn, em Nova York. Isso porque em 1823 foi substituído o solitary-system pelo silente-system. Vale dizer, deixou-se o sistema de isolamento total do indivíduo para o sistema coletivo de trabalho, porém, de forma silenciosa. O trabalho era obrigatório, bem como o silêncio, sob pena de sanções.[4]

Por fim, criou-se o sistema progressivo, consistindo na preparação do apenado, mediante etapas, para a vida em liberdade, adaptando-o à convivência com outras pessoas no ambiente social. Caracteriza-se essencialmente por períodos distintos durante o cumprimento da pena, graduando-se a rigidez com paulatina liberdade, progredindo ou regredindo, a depender da boa ou má conduta do preso.[5]

A Lei de Execuções penais adotou o sistema Progressivo, consoante artigo 33, § 2º da LEP, o qual consigna que as penas privativas de liberdade deverão ser executadas em forma progressiva, segundo o mérito do condenado, observados os seguintes critérios e ressalvadas as hipóteses de transferência a regime mais rigoroso. Ainda a LEP, de forma criteriosa, depois de algumas modificações, definiu o balizamento da progressão de regime em seu artigo 112 usque 117 da Lei nº 7.210, de 1984.

[2] SANTOS. Carlos Eduardo Ferreira. Sistemas penitenciários e o princípio da proporcionalidade. Disponível em https://www.migalhas.com.br/depeso/326810/sistemas-penitenciarios-e-o-principio-da-proporcionalidade. Acesso em 29 de outubro de 2024.

[3] MUÑOZ CONDE, Francisco; Arán, Mercedez García. Derecho Penal. Parte General. 8ª ed. Valência: Tirant Lo Blanch, 2010, p. 555.

[4] VON LISZT, Franz. Tratado de Direito Penal alemão Vol. I. História do Direito Brasileiro. Obra fac-similar. Brasília: Senado Federal, 2006, p. 418.

[5] MUÑOZ CONDE, Francisco; Arán, Mercedez García. Derecho Penal. Parte General. 8ª ed. Valência: Tirant Lo Blanch, 2010, p. 556.

Art. 112. A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos:   

I – 16% (dezesseis por cento) da pena, se o apenado for primário e o crime tiver sido cometido sem violência à pessoa ou grave ameaça;   

II – 20% (vinte por cento) da pena, se o apenado for reincidente em crime cometido sem violência à pessoa ou grave ameaça;  

III – 25% (vinte e cinco por cento) da pena, se o apenado for primário e o crime tiver sido cometido com violência à pessoa ou grave ameaça;    

IV – 30% (trinta por cento) da pena, se o apenado for reincidente em crime cometido com violência à pessoa ou grave ameaça;    

V – 40% (quarenta por cento) da pena, se o apenado for condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado, se for primário;   

VI – 50% (cinquenta por cento) da pena, se o apenado for:    

a) Condenado pela prática de crime hediondo ou equiparado, com resultado morte, se for primário, vedado o livramento condicional;     

b) Condenado por exercer o comando, individual ou coletivo, de organização criminosa estruturada para a prática de crime hediondo ou equiparado; ou    

c) Condenado pela prática do crime de constituição de milícia privada;     

VI-A – 55% (cinquenta e cinco por cento) da pena, se o apenado for condenado pela prática de feminicídio, se for primário, vedado o livramento condicional;     

VII – 60% (sessenta por cento) da pena, se o apenado for reincidente na prática de crime hediondo ou equiparado;     

VIII – 70% (setenta por cento) da pena, se o apenado for reincidente em crime hediondo ou equiparado com resultado morte, vedado o livramento condicional.    

§ 1º Em todos os casos, o apenado somente terá direito à progressão de regime se ostentar boa conduta carcerária, comprovada pelo diretor do estabelecimento, e pelos resultados do exame criminológico, respeitadas as normas que vedam a progressão.    

§ 2º A decisão do juiz que determinar a progressão de regime será sempre motivada e precedida de manifestação do Ministério Público e do defensor, procedimento que também será adotado na concessão de livramento condicional, indulto e comutação de penas, respeitados os prazos previstos nas normas vigentes.    

§ 3º No caso de mulher gestante ou que for mãe ou responsável por crianças ou pessoas com deficiência, os requisitos para progressão de regime são, cumulativamente:   

I – Não ter cometido crime com violência ou grave ameaça a pessoa;               

II – Não ter cometido o crime contra seu filho ou dependente;               

III – Ter cumprido ao menos 1/8 (um oitavo) da pena no regime anterior;               

IV – Ser primária e ter bom comportamento carcerário, comprovado pelo diretor do estabelecimento;                 

V – Não ter integrado organização criminosa.                

§ 4º O cometimento de novo crime doloso ou falta grave implicará a revogação do benefício previsto no § 3º deste artigo.    

§ 5º Não se considera hediondo ou equiparado, para os fins deste artigo, o crime de tráfico de drogas previsto no § 4º do art. 33 da Lei nº 11.343, de 23 de agosto de 2006.             

§ 6º O cometimento de falta grave durante a execução da pena privativa de liberdade interrompe o prazo para a obtenção da progressão no regime de cumprimento da pena, caso em que o reinício da contagem do requisito objetivo terá como base a pena remanescente.    

§ 7º O bom comportamento é readquirido após 1 (um) ano da ocorrência do fato, ou antes, após o cumprimento do requisito temporal exigível para a obtenção do direito.         

Art. 113. O ingresso do condenado em regime aberto supõe a aceitação de seu programa e das condições impostas pelo Juiz.

Art. 114. Somente poderá ingressar no regime aberto o condenado que:

I – Estiver trabalhando ou comprovar a possibilidade de fazê-lo imediatamente;

II – Apresentar, pelos seus antecedentes e pelos resultados do exame criminológico, fundados indícios de que irá ajustar-se, com autodisciplina, baixa periculosidade e senso de responsabilidade, ao novo regime.  

Parágrafo único. Poderão ser dispensadas do trabalho as pessoas referidas no artigo 117 desta Lei.

Art. 115. O juiz poderá estabelecer condições especiais para a concessão de regime aberto, entre as quais, a fiscalização por monitoramento eletrônico, sem prejuízo das seguintes condições gerais e obrigatórias:  

I – Permanecer no local que for designado, durante o repouso e nos dias de folga;

II – Sair para o trabalho e retornar, nos horários fixados;

III – não se ausentar da cidade onde reside, sem autorização judicial;

IV – Comparecer a Juízo, para informar e justificar as suas atividades, quando for determinado.

Art. 116. O Juiz poderá modificar as condições estabelecidas, de ofício, a requerimento do Ministério Público, da autoridade administrativa ou do condenado, desde que as circunstâncias assim o recomendem.

Art. 117. Somente se admitirá o recolhimento do beneficiário de regime aberto em residência particular quando se tratar de:

I – Condenado maior de 70 (setenta) anos;

II – Condenado acometido de doença grave;

III – Condenada com filho menor ou deficiente físico ou mental;

IV – Condenada gestante.

Ainda sobre o sistema progressivo de cumprimento de pena, existem duas Súmulas vinculantes que dizem respeito ao tema. A Súmula vinculante 56 aduz que a falta de estabelecimento penal adequado não autoriza a manutenção do condenado em regime prisional mais gravoso, devendo-se observar, nessa hipótese, os parâmetros fixados no RE 641.320/RS.

E mais recentemente, a Sumula Vinculante 59 também sinaliza diretrizes acerca do tráfico privilegiado. A referida Súmula orienta: É impositiva a fixação do regime aberto e a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos quando reconhecida a figura do tráfico privilegiado (art. 33, § 4º, da Lei 11.343/06) e ausentes vetores negativos na primeira fase da dosimetria (art. 59 do CP), observados os requisitos do art. 33, § 2º, alínea c, e do art. 44, ambos do Código Penal.

DA REMIÇÃO DA PENA

O instituto da remição da pena é forma de reduzir o cumprimento da pena, pelo trabalho, pelos estudos e pela leitura de obras científicas. O tema é tratado a partir do artigo 126 da LEP e em Resolução do Conselho Nacional de Justiça. A remição mais tradicional e antiga é pelo trabalho. Destarte, o condenado que cumpre a pena em regime fechado ou semiaberto poderá remir, por trabalho ou por estudo, parte do tempo de execução da pena. A contagem de tempo referida no caput do artigo 126 será feita à razão de:                  

I – 1 (um) dia de pena a cada 12 (doze) horas de frequência escolar – atividade de ensino fundamental, médio, inclusive profissionalizante, ou superior, ou ainda de requalificação profissional – divididas, no mínimo, em 3 (três) dias;               

II – 1 (um) dia de pena a cada 3 (três) dias de trabalho.

Para fins de cumulação dos casos de remição, as horas diárias de trabalho e de estudo serão definidas de forma a se compatibilizarem. O preso impossibilitado, por acidente, de prosseguir no trabalho ou nos estudos continuará a beneficiar-se com a remição.

O tempo a remir em função das horas de estudo será acrescido de 1/3 (um terço) no caso de conclusão do ensino fundamental, médio ou superior durante o cumprimento da pena, desde que certificada pelo órgão competente do sistema de educação. 

Abordando a temática da remição pena, o Prof. Botelho descreve com profundidade sobre o assunto, frisando que a remição se iniciou pelo trabalho, passando pelos estudos, e agora, com muita força, os Tribunais Superiores passam a admitir esta remição pela leitura. O CNJ, através da Recomendação nº 44/2013, passou a estimular a concessão do benefício pelo exercício da leitura literária, clássica, científica ou filosófica, dentre outras. Artigo 1º, inciso V, in verbis:

V – Estimular, no âmbito das unidades prisionais estaduais e federais, como forma de atividade complementar, a remição pela leitura, notadamente para apenados aos quais não sejam assegurados os direitos ao trabalho, educação e qualificação profissional, nos termos da Lei n. 7.210/84 (LEP – arts. 17, 28, 31, 36 e 41, incisos II, VI e VII), observando-se os seguintes aspectos:

Destarte, o CNJ recomenda a adoção de critério objetivo, segundo o qual, o preso terá o prazo de 21 (vinte e um) a 30 (trinta) dias para a leitura da obra, apresentando ao final do período resenha a respeito do assunto, possibilitando, segundo critério legal de avaliação, a remição de 4 (quatro) dias de sua pena e, ao final de até 12 (doze) obras efetivamente lidas e avaliadas, a possibilidade de remir 48 (quarenta e oito) dias, no prazo de 12 (doze) meses, de acordo com a capacidade gerencial da unidade prisional. Existem várias iniciativas em âmbito nacional, para permitir a remição da pena pela leitura de obras literárias, sendo que a Portaria Conjunta nº 276/2012, do Conselho da Justiça Federal (CJF) e da Diretoria Geral do Departamento Penitenciário Nacional (Depen) do Ministério da Justiça, disciplinou o projeto de remição pela leitura para os presos de regime fechado custodiados em penitenciárias federais de segurança máxima.[6]

[6] BOTELHO. Jeferson. Breves anotações sobre a Remição Penal pela leitura. Disponível em Remição penal pela leitura – Jus.com.br | Jus Navigandi. Acesso em 30 de outubro de 2024.

DO LIVRAMENTO CONDICIONAL DA PENA

O instituto do livramento condicional é estudado a partir do artigo 83 do Código penal brasileiro. Neste caso, necessariamente, o condenado deverá cumprir parte da pena privativa de liberdade, e de acordo com determinadas circunstâncias objetivas e subjetivas, é possível que o beneficiário cumpra o restante da pena em liberdade. O período de prova é sempre o restante da pena que falta cumprir, e que durante esse tempo do liberado será provado quanto ao mérito da concessão do benefício, o que poderá ser revogado nos casos previstos em lei.

Assim, de acordo com a leitura do artigo 83 do CP, o juiz poderá conceder livramento condicional ao condenado a pena privativa de liberdade igual ou superior a 2 (dois) anos, desde que: 

I – Cumprida mais de um terço da pena se o condenado não for reincidente em crime doloso e tiver bons antecedentes;         

II – Cumprida mais da metade se o condenado for reincidente em crime doloso; 

III – Comprovado:           

a) bom comportamento durante a execução da pena;           

b) não cometimento de falta grave nos últimos 12 (doze) meses;           

c) bom desempenho no trabalho que lhe foi atribuído; e         

d) aptidão para prover a própria subsistência mediante trabalho honesto;        

IV – Tenha reparado, salvo efetiva impossibilidade de fazê-lo, o dano causado pela infração;          

V – Cumpridos mais de dois terços da pena, nos casos de condenação por crime hediondo, prática de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, tráfico de pessoas e terrorismo, se o apenado não for reincidente específico em crimes dessa natureza.          

Para o condenado por crime doloso, cometido com violência ou grave ameaça à pessoa, a concessão do livramento ficará também subordinada à constatação de condições pessoais que façam presumir que o liberado não voltará a delinquir.   Revoga-se o livramento, se o liberado vem a ser condenado a pena privativa de liberdade, em sentença irrecorrível por crime cometido durante a vigência do benefício. O juiz poderá, também, revogar o livramento, se o liberado deixar de cumprir qualquer das obrigações constantes da sentença, ou for irrecorrivelmente condenado, por crime ou contravenção, a pena que não seja privativa de liberdade. O assunto em tela também é disciplinado na LEP. Assim, o artigo 132 estabelece as condições obrigatórias e facultativas a que o liberado ficará subordinado.

Desta feita, deferido o pedido, o Juiz especificará as condições a que fica subordinado o livramento. Serão sempre impostas ao liberado condicional as obrigações seguintes: a) obter ocupação lícita, dentro de prazo razoável se for apto para o trabalho; b) comunicar periodicamente ao Juiz sua ocupação; c) não mudar do território da comarca do Juízo da execução, sem prévia autorização deste. Poderão ainda ser impostas ao liberado condicional, entre outras obrigações, as seguintes: não mudar de residência sem comunicação ao Juiz e à autoridade incumbida da observação cautelar e de proteção; recolher-se à habitação em hora fixada; não frequentar determinados lugares e utilizar equipamento de monitoração eletrônica.  O juiz não poderá declarar extinta a pena, enquanto não passar em julgado a sentença em processo a que responde o liberado, por crime cometido na vigência do livramento. Se até o seu término o livramento não é revogado, considera-se extinta a pena privativa de liberdade.

DO INDULTO, DA GRAÇA E DA ANISTIA

Induto, graça e anistia são causas extintivas da punibilidade previstas no artigo 107, inciso II, do Código penal brasileiro. São causas vinculadas à medidas de políticas criminais. A competência para conceder indulto e graça é do Presidente da República, conforme previsão expressa no artigo 84, inciso XII, da Carta Magna. Por sua vez, cabe ao Congresso Nacional a concessão de anistia, consoante artigo 48, inciso VIII, da Constituição da República de 1988.

REFLEXÕES FINAIS

Uma verdadeira viagem metafórica nos institutos que conduzem o delinquente à liberdade; um sem número de benefícios processuais que dão concretude a regra da liberdade em casos de violações às normas penais. Percebe-se que existe uma quantidade enorme de delitos de pequeno potencial ofensivo, bastando o autor assumir o compromisso de comparecer ao Juizado Especial Criminal, e tudo resolvido; são exatamente 131 crimes possíveis de lavratura de Termo Circunstanciado de Ocorrência – TCO, previstos somente no Código Penal e de novo o criminoso voltando às ruas. 

 Se não for o caso de crime de menor potencial ofensivo, resta a possibilidade de depósito de fiança, sendo 77 casos de crimes afiançáveis somente no CP, podendo ser conhecido por decisão do delegado de polícia logo após a lavratura do AFPD, e logo o delinquente de volta às ruas.

Lembrando que de acordo com levantamentos realizados, reafirma-se, existem pelo menos 77 crimes possíveis de concessão de fiança pelo delegado de polícia, em sede de IP, somente no Código penal, em contar os corriqueiros casos de porte e posse de arma de fogo de uso permitido, embriaguez na condução de veículos automotores, racha na direção de veículo, homicídio culposo na direção de veículo e até uso de drogas por pilotos de aeronaves, previstos em leis esparsas, tudo isso cabe ao delegado de polícia arbitrar um valor de fiança.

Vencidas essas etapas na delegacia de polícia, vem a possiblidade da conversão da prisão por 10 por pelo menos medidas cautelares do artigo 319 do CPP, na audiência de custódia. Vencida a fase da audiência de custódia, restam ainda duas possiblidades do processo não caminhar. A possibilidade da suspensão condicional do processo, nos crimes de médio potencial ofensivo, artigo 89 da Lei nº 9.099, de 1995, aqui há pelos menos 102 hipóteses de cabimento deste benefício previstos no CP. E depois desse rol de benefícios ainda resta a possibilidade do acordo de não persecução penal, artigo 28-A do CPP.

Depois de tudo isso, vamos começar efetivamente o processo? Se houver condenação a pena não superior a 4 anos de prisão, se o crime não for praticado com violência ou grave ameaça a pessoa, vamos substituir a pena privativa de liberdade por pena restritiva de direitos, prestação de serviços à comunidade, prestação pecuniária, limitação de fim de semana. Antes disso, ainda tem a possiblidade da suspensão condicional da pena, o famoso sursis.

Mas agora não tem jeito, o criminoso conseguiu vencer todas essas etapas. Agora é de lascar, não tem jeito mesmo; vai ter que recolher ao cárcere. Terá direito a progressão de regime, sob o conforto das Súmulas Vinculantes 56 e 59, fará jus ao trabalho interno e externo, terá direito a remição da pena pelo trabalho, pelos estudos, pela leitura de obras literárias, e agora querem remir a pena do preso que realiza atividades recreativas no interior do presídio. Mas ainda não acabou. Tem induto, graça e anistia; tem livramento condicional da pena; mas enfim, conseguiu sair do presídio, mas ainda durante 60 dias terá assistência ao egresso para retornar ao convívio social. Parou? Se for em Minas Gerais o preso terá ao sagrado direito ao período de férias, de acordo com o artigo 59 da Lei 11.404, de 1994, lei de execução penal no Estado berço da liberdade.

Com seus mais de 840 mil presos recolhidos nos estabelecimentos penais, no ranking de 3ª maior população carcerária do mundo, há quem sustente ainda que o Brasil prende muito e mal; o ideal talvez fosse o cumprimento das normas de convivência sem necessitar de normas jurídicas; o ideal fosse todo mundo do sistema penal perder seus cargos, suas funções porque não existe mais ninguém para punir; assim, cumprir as normas de conduta oriundas do pacto social passaria a ser um direito natural. Claramente, estamos diante de um sonho ou uma quimera. Deixamos a utopia de lado para afirmar com todas as letras que vivemos inexoravelmente numa sociedade altamente criminosa; egoísta; arrogante; por isso, sempre haverá alguém transgredindo as leis, inclusive, nesse instante é possível que estejam acontecendo crimes em algum lugar deste Torrão, gente matando, roubando, desviando dinheiro público nos suntuosos gabinetes em Brasília ou em qualquer outro lugar, e assim, o aparato estatal sempre será necessário para punir os recalcitrantes do contrato social.

Pelo menos em sede de direito penal, não obstante aos teóricos do sistema do garantismo monocular hiperbólico, aos amantes da intervenção mínima, aos apaixonados e acometidos pela síndrome de Estocolmo, aos adeptos ao princípio da felicidade plena, aos críticos do direito penal estigmatizante, aos lunáticos defensores das penas alternativas, um lado, e de outro, inobstante aos frenéticos defensores do direito penal máximo, aos compulsivos tatuadores de arminhas pelo corpo, aos seguidores do direito penal do inimigo, aos aloprados bélicos, e mais que isso, apesar dos narcisistas otimizados, dos midiáticos desenfreados, dos mercadores do sangue, dos cabotinos de gabinetes, dos paladinos da justiça, dos que se acham monopolizados da sabedoria jurídica, é certo que o delinquente tem o direito inalienável de ir para as profundezas do cativeiro dos ímpios, dos pecadores, do reservatório de almas condenadas, com as vestes rituais e exuberantes do corpo, num ataúde cheio de flores, vermelhas ou lilás, hermeticamente fechado, desde que no meio do trajeto não venha a transgredir direitos alheios.

BIBLIOGRAFIA

BOTELHO. Jeferson. A concessão de fiança pelo delegado de Polícia. Disponível em Concessão de fiança pelo delegado de polícia – Jus.com.br | Jus Navigandi. Acesso em 08 de novembro de 2024.

BRASIL. Constituição da República de 1988. Disponível em Constituição. Acesso em 29 de outubro de 2024.

BRASIL. Código de Processo Penal. Disponível em Del3689Compilado. Acesso em 29 de outubro de 2024.

BRASIL. Código Penal Brasileiro. Disponível em DEL2848compilado. Acesso em 29 de outubro de 2024.

BRASIL. Lei de Execução Penal. Disponível em L7210. Acesso em 29 de outubro de 2024.

BRASIL. Lei do Juizado Especial Criminal. Disponível em L9099. Acesso em 29 de outubro de 2024.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Disponível em Supremo Tribunal Federal. Acesso em 29 de outubro de 2024.

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