Pra você

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Aníbal Gonçalves – Pedagogo

Claro que você bem merece uma crônica brotada de meu modesto estro. Há tanta coisa escrita por aí a solta, tanta coisa ruim e evidentemente falsa, tanta tinta e papel gastos em vão e você não acha o escrito tupiniquim meio assim? Você não acha como eu a realidade meio chata? Pois eu acho. E mergulho as mãos sedentas lá bem fundo, onde a vida é buliçosa, onde fervem as paixões mais contraditórias. Ah, como eu te amo de um amor mais natural possível e até hoje não entendi como você suporta bravamente o amargo peso do mundo.

Isso porque sei de suas asas embutidas na armadura corporal, dos seus vulcões, de suas furnas espirituais e sei de seus jardins e seus pomares sentimentais, da sua sensibilidade, por vezes quase feminina, todavia, uma sensibilidade com luvas de boxe. O quanto ainda lhe interessa sinceramente… o mundo? O Brasil? E os destinos dos homens? As pessoas realmente lhe são, de certo modo, interessantes? Matéria de seu lavor? Oh, doce e obsceno pássaro da juventude quando a vida, um gesto nada mais que um gesto, simplesmente.

Nada mais óbvio que mesmo enquanto você bebe vinho Naturelle, o diabo do mundo não vai parar de girar nem um mísero segundo. A vida segue dengosa sobre os trilhos e a tarde azul estende-se preguiçosa sobre os horizontes da nossa cidade, que nem é mais a sua cidade, naquela hora íntima que você está receptiva e solitária feito uma criança sem brinquedos. Tem nada não. Pensa que é só você que ouve um piano solitário dentro do mar? Sabe aquela hora infinitamente deserta em que você se apaixona por alguém que você nem conhece o nome?

Vem uma vontade de comer pipocas feitas pelo Flávio, de beber caldo de cana na “Estrada do Boi” e tudo isso e mais aquilo como fazer um poema e descortinar da sua janela a imensidão do mundo – que lhe é mostrada aos domingos pelo Alvaro Garnero – e pensar que ele é pequeno para o seu desejo e a culpa nem é sua se o mundo sempre foi menor que seu menor poema e esse tal de amor espalhado pela cidade como uma doença contagiosa e você não precisa disso tudo nunca mais. E aí você descobre a origem da sua dor e reveste a lama do sofrimento com o aveludado das palavras.

Aníbal Gonçalves é pedagogo, graduado em Administração Escolar, ex-diretor da Escola Estadual de Coroaci – MG [hoje Dona Sinhaninha Gonçalves] e professor de Filosofia, Sociologia e História da Educação. Foi chefe do Departamento de Educação Cooperativista da CLTO. Atualmente, jornalista e radialista da 98 FM (Teófilo Otoni) e colunista do Jornal Diário Tribuna.

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