Domingo nesta Filadélfia…

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Aníbal Gonçalves – Pedagogo

O último domingo amanheceu ensolarado como há tempo eu não via nessa temporada de chuvas que sobre nós desabam sem aviso prévio e nos surpreendem quando menos as esperamos e desejamos. Fez um solzão desses que pareciam incendiar o dia e cegar os olhos de quem se atrevia a erguer a vista para o céu mais demoradamente.

O domingo pareceu estimular louras, morenas, negras, mulheres de todas as cores a atraírem o olhar cúpido dos homens e o de outras fêmeas, pois hoje ninguém sabe mais quem é quem em matéria de preferência sexual.

O domingo solar, como esse que reinou em Teófilo Otoni, costuma se transformar num furdunço regado a carraspana. Apesar da pandemia da Covid-19, neste domingo quase tudo foi motivo de festa, alegria e as aglomerações se tornaram a “ordem do dia” mesmo com o Novo Coronavírus à espreita.

Os donos de restaurantes e de pizzarias estão tendo motivos pra se queixar da vida, pois até mesmo nos botecos a distinta freguesia já há muito se escafedeu, revelando a quase generalizada quebradeira desse setor – “batizado” e severamente punido como um dos responsáveis pela exposição das pessoas ao contágio do Novo Coronavírus.

Muitos também encheram a “cara” e as dependências dos hospitais Santa Rosália e “Dr. Raimundo Gobira” devem ter ficado lotadas devido aos acidentes provocados pelos irresponsáveis do volante e os malucos que pilotam as motos – como se esses veículos fossem a extensão de suas genitálias.

No domingo naturalmente se instalou o desvairado reinado de Baco [para os desavisados, deus romano do vinho e das festas] e a irresponsabilidade dominou a maioria dos humanos mortais. E os pecados dominicais, quer sejam veniais ou mortais, já se sabe que quem os paga é a implacável segunda-feira, porque a realidade não aceita promissórias nem dívidas atrasadas.

As crianças devem ter sentido um gostinho de liberdade depois de haverem passado a semana inteira trancafiadas nas casas ou entre as grades dos condomínios.

No domingo, as amantes amarguraram a solidão, pois não receberam a amorosa visita de seus amores clandestinos, que estiveram, a contragosto – presumo, cumprindo os obrigatórios deveres conjugais na companhia das amantíssimas esposas e dos filhos. As amantes ganharam, no máximo, um rápido telefonema de fingido carinho e as tradicionais desculpas de sempre a que já estão acostumadas enquanto ainda não possuem o domínio total da relação, que algumas conseguem e a maioria não. Semana que vem as pazes serão seladas do modo costumeiro e tudo continuará como dantes no Quartel de Abrantes da paixão.

Ah, sim. Ia me esquecendo daqueles naturalmente dotados de pendores domésticos que preferem ficar em casa por escolha própria, diante da TV, controle remoto nas mãos, mudando constantemente de canal como quem procura sabe-se lá o quê ou se dedicam a fazer pequenos consertos caseiros perfeitamente dispensáveis.

Aos domingos a vida parece correr mais mansa, mais pacífica. As preocupações cotidianas são varridas pra debaixo do tapete pelo menos por um dia, e por vezes eu ou você que lê esta croniqueta, ou o sempre atualizado médico Endocrinologista Dr. Enos Lorentz – ou ainda o advogado e Conselheiro Estadual da OAB-MG, Dr. Reynaldo do Carmo Neves -, temos a ilusória impressão de que o sossego bateu à nossa porta, embora saia pela janela mal chega a noite prenunciando a volta da rotina. De qualquer modo, o domingo iguala todos nós ao atiçar nossa sede insaciável de divertimento, contudo provisória. Talvez porque o sol adie o fim da tarde, crie ilusões à toa tal qual o vento brinca esculpindo nuvens aqui nesta Filadélfia*.

P.S.: *nome da colônia fundada por Teófilo Benedito Ottoni, que originaria o município de Teófilo Otoni

Aníbal Gonçalves é pedagogo, graduado em Administração Escolar, ex-diretor da Escola Estadual de Coroaci – MG [hoje Dona Sinhaninha Gonçalves] e professor de Filosofia, Sociologia e História da Educação. Foi chefe do Departamento de Educação Cooperativista da CLTO. Atualmente, jornalista e radialista da 98 FM (Teófilo Otoni) e colunista do Jornal Diário Tribuna.

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