
Delegado Geral de Polícia – Aposentado. Prof. de Direito Penal e Processo Penal. Mestre em Ciência das Religiões pela Faculdade Unida de Vitória/ES. Especialização em Combate à corrupção, antiterrorismo e combate ao crime organizado pela Universidade de Salamanca – Espanha. Advogado. Autor de livros.
Neste sábado, 07 de dezembro, o Código Penal completa 84 anos de existência. O Prof. Jeferson Botelho apresenta à sociedade brasileira estudos inéditos sobre a evolução histórica do Código, numa dinâmica social, desde a apresentação do Projeto de Lei do jurista Alcântara Machado, de viés italiano e exaustivo trabalho da comissão revisória de raiz suíça.
As relações sociais são marcadas por acontecimentos de altíssima complexidade; viver é um potencial risco desde o nascituro; a dinâmica social se apresenta, veloz e imprevisível; conflitos sociais de toda ordem; sociais, culturais, emocionais, étnicos, religiosos, políticos, econômicos, familiares, e tantos outros; avanços e retrocessos; a imperiosa e necessária codificação de comportamentos humanos; pois nem sempre o bom senso é instrumento eficaz na resolução de questões divergentes; nem sempre a razão é capaz de estabelecer a tão sonhada cultura da paz; nem sempre os direitos naturais são respeitados; mas a grande maioria ou quase todos desejam harmonia na sociedade; salta aos olhos o egoísmo individual, constituindo-se barreira instransponível e ameaça iminente para a segurança e vida das pessoas; todos querem plena felicidade.
Todos querem viver com intensidade não somente nas publicações midiáticas, nas redes sociais em eventos de finais de semana; as pessoas merecem ser felizes na vida real; entrementes, nem mesmo o processo civilizatório bem próspero é ferramenta de construção de vida plena e feliz; a busca por uma sociedade justa e fraterna, objetivo da República Federativa deve ser amparada por normas de comando, com previsão de direitos e deveres, e quando os bens jurídicos são ameaçados ou sofram efetivamente agressões, deve o Estado entrar em cena com o seu direito de punir, através da ética no agir, sempre por meio de um processo regular e célere, nunca por meio da violência, da prepotência e da boçalidade, tudo conforme moldura do art. 5º, LIV da Magna Carta de 1988. Nesse sentido, as leis penais e todo o sistema de comando, cível e administrativo são espécies normas de controle social repressivo.
A parte geral é tratada desde o artigo 1º até o artigo 120; a parte especial, compreende o artigo 121 até o artigo 361. Em razão do tema abordando neste ensaio, analisar-se-á, com ênfase a parte especial definidora dos crimes. Os crimes são definidos a partir de uma conduta humana, voluntária, comissiva ou omissiva, traduzida num movimento corpóreo ou numa abstenção, por meio de verbos descritos no infinitivo, podendo ser uninuclear ou plurinuclear. Após pesquisas heurísticas realizadas no estatuto repressivo, foram encontrados exatamente 241 crimes no atual Código Penal. Essas pesquisas apontam ainda que a parte especial do CP é formada por 475 verbos, entre construções verbais simples e verbos de conduta múltipla. São 77 crimes afiançáveis em que o próprio delegado de polícia, durante a lavratura do APFD poderá conceder a fiança na forma do artigo 322 do CPP, que textualmente dispõe que a autoridade policial somente poderá conceder fiança nos casos de infração cuja pena privativa de liberdade máxima não seja superior a 4 (quatro) anos.
Esses levantamentos apontam algo em torno de 125 crimes de menor potencial ofensivo, cuja pena máxima em abstrato não seja superior a 02 anos; nestes casos lavra-se tão somente um Termo Circunstanciado de Ocorrência – TCO, o que permite aplicação de penas alternativas sem a possibilidade de gerar antecedentes policiais. Outrossim, o Código Penal prevê a ocorrência de 89 casos de crimes de médio potencial ofensivo, cuja pena mínima em abstrato não seja superior a 01 ano, e nestes casos, havendo o preenchimento de determinas circunstâncias, haverá a suspensão condicional do processo, art. 89 da Lei nº 9.099, de 1995, por um período de provas de 02 a 04 anos. Seleciona-se, aqui o G-25 em crimes que permitem referida suspensão: homicídio culposo, aborto com consentimento da gestante, autoaborto, lesão corporal grave, sequestro e cárcere privado, invasão de dispositivo informático, furto simples, apropriação indébita, estelionato, receptação, ocultação de cadáver, vilipêndio a cadáver, importunação sexual, divulgação de cenas de estupro, rufianismo, abandono material, explosão, associação criminosa, falsificação de documento particular, corrupção ativa em transação internacional, patrocínio infiel, coação no curso do processo, falsidade ideológica, fraude em certame de interesse público e violência arbitrária.
De grande louvor, para ajustar o ordenamento jurídico com a sociedade moderna, foram criadas as figuras típicas da intimidação sistemática ou bullying, a intimidação sistemática virtual ou cyberbullying, artigo 146-A do CP; destaca-se também a previsão do crime de perseguição ou stalking, artigo 147-A, por meio da Lei nº 14.132, e 2021. Por derradeiro, um destaque especial para a proteção dos direitos das mulheres, com a previsão dos crimes de violência psicológica contra a mulher e o crime autônomo de feminicídio, previstos respectivamente, nos artigos 147-A e 121-A do Código Penal. Por último, releva observar que o Código Penal em vigor em 1º de janeiro de 1942, sofre a primeira modificação somente 25 anos depois; nos dias hodiernos, é preciso muda-lo quase todos os dias; isto por conta de dois fatores: o primeiro em razão da própria dinamicidade social; outro por conta da arrogância dos homens; da maldade que campeia nos corações da humanidade; As condutas criminosas são traduzidas em verbos no infinitivo; esses verbos por ser simples ou múltiplos; assim, tem-se os verbos uninucleares e os verbos plurinucleares. Hoje, o CP conta exatamente com 475 verbos descritivos das condutas criminosas. Costuma-se dizer que a vida é mais rica que a previsibilidade normativa. E isso é muito verdadeiro. O CP prestes a completar seus 84 anos de existência foi modificado inúmeras vezes ao longo de todo esse tempo; a lei nº 7.209 de 1984 criou uma nova parte geral do CP; as duas partes geral e especial, passaram por grandes modificações ao longo do tempo.
Cabe destacar que pelo menos 3 crimes foram revogados ao longo desse tempo; à guisa de exemplos, citam os crimes de adultério, rapto e sedução que foram revogados pela lei nº 11.106, de 2005. Outra mudança significativa, foi a edição da Lei nº 6368, de 76, que revogou o artigo 281 do CP que disciplinava o comércio, a posse e o uso de drogas no Brasil.
Observação importante foi a mudança dos crimes contra os costumes para crimes contra a dignidade sexual, com advento da Lei 12.015, de 2009. Nas últimas duas décadas foram processadas mudanças relevantes no CP, como a criação de tipos penais como assédio sexual, arranjo no crime de tráfico de pessoas, no artigo 149-A, e revogação do art. 231 do CP; a tipificação da conduta de condicionamento de atendimento médico-hospitalar de emergência, artigo 135-A; a criação do § 9º no artigo 129 do CP, que definiu a lesão corporal com violência doméstica; destaca-se positivamente a criação da Lei nº 12.737, de 2012, batizada por Lei Carolina Dieckmann, criando o crime de invasão de dispositivo informático, artigo 154-A, do CP; a conduta criminosa de injúria racional ou qualificada foi tipificada no § 3º do art. 140 do CP; o crime de receptação de animais ganhou destaque ao punir a conduta no artigo 180-A do CP; na esfera dos crimes contra a dignidade sexual, ganha relevo social, a criação dos tipos penais de importunação sexual, art. 215-A, o crime de divulgação de cenas de estupro, art. 218-C, e as causas de aumento de penas para os casos de estupro coletivo e estupro corretivo; há a criação do crime de promoção de migração ilegal no artigo 232-A do CP; a fraude eletrônica no estelionato é balizada no § 2º do art. 171, do CP; o artigo 122 do CP passou por modificações significativas para contemplar também na figura criminosa de participação em suicídio dos casos de automutilação, que causou tanta preocupação da sociedade brasileira como os casos de automutilação dos jogos da baleia azul no Brasil.
Por fim, nas bifurcações da vida, há sempre caminhos melhores; o segredo de viver bem reside no processo de escolhas; não ignorar a miséria de muitos; o sofrimento alheio; ter bons hábitos, ser solidário; esse é um mundo ideal; infelizmente, o ser humano morreu há muito tempo; ele vive perambulando no plano terrestre com almas perdidas, cadáveres postergados, putrefeitos em conservação; são esqueletos desumanos, insensíveis, desprovidos de sentimentos fraternos; o que existe no seu corpo são órgãos em funcionamento, sangue jorrando, exangue, um paradoxo, mas desprovido de amor fraterno, coração maldoso, tecidos necrosados, mente vingativa, e vaidades sem limites; o ataúde apenas aguarda o momento exato de receber o corpo maligno para conduzi-lo às profundezas do infinito, distante das civilizações humanas; diante deste quadro desolador, é preciso eleger o amor como solução para a paz social, é necessário ainda apostar no ser humano como condutor de sonhos e quimeras; sonharemos juntos, mas sonharemos acordados, pois, assim, temos a faculdade de escolhermos o final e o roteiro dos sonhos, tudo por uma sociedade melhor; ter o direito de viver num território de paz, de tranquilidade, sem violência; ter a liberdade de transitar sem medo de ser assaltado, sem medo de ser atingido por balas perdidas, enfim, viver sem tantas leis disciplinando comportamentos sociais; pugnando por um cenário mais inclusivo com fontes de mais amor, solidariedade, juncado de sentimento humanístico, tudo por uma sociedade mais humana, fraterna e solidária.










