OS NOVOS RUMOS DA SOCIOEDUCAÇÃO, A INTEGRAÇÃO EM PAUTA NA POLÍTICA PÚBLICA:

0
1095

“O CASO DE MINAS GERAIS”

Professor Jeferson Botelho. Professor de Direito Penal e Processo Penal. Especialização em Combate à corrupção, antiterrorismo e combate ao Crime Organizado pela Universidade de Salamanca – Espanha. Autor de obras jurídicas. Advogado em Minas Gerais

Leandro Almeida. Subsecretário de Atendimento Socioeducativo – SUASE – Secretaria de Justiça e Segurança Pública de Minas Gerais. Administrador Público, Especialista em Política Pública e Socioeducação PUC-Minas. Mestrando em Segurança Pública e Cidadania da Universidade do Estado de Minas Gerais – Faculdade de Políticas Públicas Tancredo Neves
A primeira ideia que uma criança precisa ter é a da diferença entre bem e o mal. E a principal função do educador é cuidar para que ela não confunda o bem com a passividade e o mal com a atividade.” (MARIA MONTESSORI)

RESUMO. Considerando a relevância da implementação das políticas públicas e as evidências encontradas pelas ciências sociais, pode-se afirmar que as inovações mais significativas introduzidas nessa área, nas últimas décadas, foram aquelas que tornaram possível a redução do crime e a ressocialização a partir de abordagens pautadas por aspectos de gestão bem definidos e integração de atores relevantes. Ainda assim, a busca por resultados efetivos de projetos em políticas públicas que modernizem modelos e processos institucionais, continua apresentando-se como gargalo estrutural da administração pública. Dentre os maiores desafios observa-se a ausência de planejamento, a falta de integração das equipes, e a indefinição na clareza de suas competências, bem como o aprimoramento profissional. O objetivo deste trabalho consiste na associação de fatos relevantes ocorridos nas últimas décadas no contexto das políticas públicas de segurança e defesa social, sobretudo no tocante à relação a Política Socioeducativa, seu fator histórico, os avanços permitidos após advento da carta constituinte e do ECA – Estatuto da Criança e Adolescente e os aspectos inseridos no contexto da execução desta política. Amparados pelo olhar teórico das abordagens e das produções técnicas, este artigo busca oportunizar reflexões sobre os aspectos de integração e gestão desenvolvidos no Estado Minas Gerais, seus desdobramentos e necessidades voltados para o desenvolvimento de uma política pública de segurança e defesa social, inclusiva e verdadeiramente cidadã.

Palavras-chave: Segurança, política, gestão, social, integração.

NOTAS INTRODUTÓRIAS

O fenômeno infracional juvenil passou por significativas mudanças ao longo das últimas décadas e a maneira do Estado em geri-lo, também precisou se alterar.

Foi partindo da evolução do chamado código de menores, que em suas duas versões, que esteve vigente de 1927 a 1990, era o referencial jurídico institucional que pautava as ações direcionadas a crianças e adolescentes, atendendo conjuntamente casos relacionados a atos infracionais, abandono e outros abusos.

O processo de democratização no que culminou na consagração da constituição de 1988 já demarcou novos rumos no olhar para com as crianças e adolescentes do nosso País. Como está descrito no art. 227:

“É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”. (BRASIL, 1988).

Ratificando aspirações internacionais sobre a matéria, o Presidente Fernando Collor de Melo, sanciona em 13 de julho de 1990, O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), revogando em mesmo ato, demais disposições contrárias, leis nº 4.513 de 1964 e lei nº 6.697 de 1979 (código de menores), determinando novas campanhas informativas acerca do novo dispositivo.

O legislador buscou efetivar as novas aspirações, dando manifesta ênfase a representação de prioridade da criança e adolescente frente as políticas públicas, assim citando em seu artigo 4º,5º e 6º:

“É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.

Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende:

a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias;

b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública;

c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas;

d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude.

 Art. 5º Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais.

Art. 6º Na interpretação desta Lei levar-se-ão em conta os fins sociais a que ela se dirige, as exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais e coletivos, e a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento”. (BRASIL, 1990)

A reforma positivada pela constituinte 88, ratificada no ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), buscou também imputar tratamento adequado, ao fenômeno da criminalidade juvenil, apontando as medidas socioeducativas com o objetivo de alcançar a responsabilização pelo ato cometido, sem, contudo, desviar-se do caráter educativo da medida como sentido prioritário, conforme preceitua a legislação, em seu título III, Da Prática do Ato Infracional:

Art. 103. Considera-se ato infracional a conduta descrita como crime ou contravenção penal.

Art. 104. São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às medidas previstas nesta Lei.

Parágrafo único. Para os efeitos desta Lei, deve ser considerada a idade do adolescente à data do fato.

Art. 105. Ao ato infracional praticado por criança corresponderão as medidas previstas no art. 101. (BRASIL, 1990)

Nesta perspectiva, no tocante ao ato processual, a responsabilização pelo ato infracional cometido, passa a ter fulcro nas possibilidades apresentadas pelo estatuto:

Art. 112. Verificada a prática de ato infracional, a autoridade competente poderá aplicar ao adolescente as seguintes medidas:

I – advertência;

II – obrigação de reparar o dano;

III – prestação de serviços à comunidade;

IV – liberdade assistida;

V – inserção em regime de semiliberdade;

VI – internação em estabelecimento educacional;

VII – qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI.

§ 1º A medida aplicada ao adolescente levará em conta a sua capacidade de cumpri-la, as circunstâncias e a gravidade da infração.

§ 2º Em hipótese alguma e sob pretexto algum, será admitida a prestação de trabalho forçado.

§ 3º Os adolescentes portadores de doença ou deficiência mental receberão tratamento individual e especializado, em local adequado às suas condições.

Art. 113. Aplica-se a este Capítulo o disposto nos arts. 99 e 100.

Art. 114. A imposição das medidas previstas nos incisos II a VI do art. 112 pressupõe a existência de provas suficientes da autoria e da materialidade da infração, ressalvada a hipótese de remissão, nos termos do art. 127.

Parágrafo único. A advertência poderá ser aplicada sempre que houver prova da materialidade e indícios suficientes da autoria. (BRASIL,1990)

A luz desta inovadora legislação abordaremos um recorte sobre a execução prática das medidas socioeducativas no Brasil. Identificando processos de gestão, alcances e desafios presentes nesta política pública.

1 PANORAMA NACIONAL

A verdadeira educação é aquela que vai ao encontro da criança para realizar a sua libertação. (Maria Montessori)

Aprovado pela Lei nº 12.594, sancionada pela presidente Dilma Rousseff, em 18 de janeiro de 2012, o SINASE – Sistema Nacional de atendimento Socioeducativo abarcou inovações, regulamentado a execução e aplicação das medidas socioeducativas em todo Brasil, em sua versão anterior o sistema era regulamentado pela Resolução nº 119/2006, do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente – CONANDA, que trazia premissas a aplicabilidade das medidas.

“O Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente- CONDANDA, foi instituído em 12 de outubro de 1991, através da Lei nº 8.242, com o objetivo de coordenar as ações de proteção e promoção dos direitos das crianças e dos adolescentes é o principal órgão do sistema de garantia de direitos”. (Grifo nosso)   

No ano de 2020 o SINASE- Sistema Nacional de atendimento Socioeducativo publicou relatório técnico, contendo pesquisa de avaliação do sistema socioeducativo no Brasil, em seus diversos eixos. A pesquisa apresentou que no ano de 2019 o Brasil atendeu 46.193 adolescentes distribuídos entre as medidas de semiliberdade, internação provisória e internação, e internação sanção, conforme quadro abaixo:

Quadro 1 – Total de adolescentes informado

A de se destacar ainda a análise temporal estabelecida no referido diagnóstico, no tocante ao tempo de duração das medidas em âmbito nacional que média tem: 41,89 dias na internação provisória; 110,15 dias na internação sanção; 482,34 dias na internação e 290,77 dias na medida de semiliberdade. Conforme informações do quadro abaixo:

Quadro 2 – tempo de duração da medida socioeducativa em dias
“Tal medida pode indicar ao administrado modelos e metodologias de gestão e processos, buscando maior eficiência em seu atendimento”. (Grifo nosso)

O estudo aponta ainda para a necessidade de se efetivar o monitoramento de egressos desta política pública, conforme aponta o referido relatório:

“O Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo deve verificar a situação do adolescente após cumprimento da medida socioeducativa, tomando por base as suas perspectivas educacionais, sociais, profissionais e familiares. Esta previsão está inscrita no Estatuto da Criança e do Adolescente (BRASIL, 1990), ao estabelecer no art. 94, inciso XVIII, que as entidades que desenvolvem programas de internação devem manter programas destinados ao apoio e acompanhamento de egressos. Assim, a gestão estadual deve coletar periodicamente informações a respeito das condições pessoais dos adolescentes egressos do Sistema. O banco de dados estruturado a partir dessas informações poderá auxiliar na avaliação da efetividade da intervenção socioeducativa, de modo a qualificar a atuação das entidades que participam do Sistema Socioeducativo estadual”. (BRASIL,2020)

2 CRIMINALIDADE JUVENIL E POLÍTICA SOCIOEDUCATIVA

As pessoas educam para a competição e esse é o princípio de qualquer guerra. Quando educarmos para cooperarmos e sermos solidários uns com os outros, nesse dia estaremos a educar para a paz. (Maria Montessoni)

Podemos indicar que o fenômeno da criminalidade juvenil é multifatorial em suas nuances e consequências.

Ampliando este espectro, Soares (2006, p. 93, grifo nosso) comenta, “as explicações para a violência e o crime não são fáceis […] não existe o crime, no singular”. Por sua vez, Dalla (2006, p. 12) afirma que “o fenômeno da criminalidade apresenta associações com uma multiplicidade e complexidade de fatores sociais que não se esgotam no âmbito da ação de agências isoladas”.

Em outras palavras, esses fenômenos são por sua natureza complexos e múltiplos como explicitado por Soares (2006) e Zaluar (2007). Como tais fenômenos podemos elencar as tipologias de acordo com Soares (2006).

Sob este campo de reflexão nos deparamos com a nossa própria história, nossos medos, anseios, mazelas e marcas estruturais de uma sociedade desafiada a reinventar a sobrevivência frente às intempéries e desafios sociais, dentre os mais recentes, talvez o principal seja a cultura do medo. Para Wermuth (2005):

O processo de globalização e a consequente sociedade de risco que se configura na contemporaneidade propiciam o surgimento de um sentimento generalizado de insegurança diante da imprevisibilidade e da liquidez[3] das relações sociais. A globalização introduz, a cada dia, no catálogo dos riscos e inseguranças, novas e aterradoras formas que eles podem assumir. Paradoxalmente, o aumento da crença de se estar habitando um mundo cada vez mais seguro e controlado pela humanidade é inversamente proporcional ao avanço da ciência e da tecnologia (WERMUTH, 2005, p. 6).

Nesta seara, o medo é fator a ser analisado, gerido e enfrentado. Ele emerge nas diversas esferas da cidade, suas configurações estão na base das alterações observadas na vida contemporânea e também da “evolução” das cidades, tornando-se capaz de converter-se nas mais diversas manifestações, conforme afirma Wermuth (2005):

Como consequência inafastável dos cada vez mais fortes sentimentos de insegurança e medo na sociedade contemporânea, tem-se o aumento da preocupação com as novas formas de criminalidade que se apresentam nesta realidade, notadamente as relacionadas ao crime organizado e ao terrorismo, sendo os atentados terroristas ocorridos em Nova Iorque em setembro de 2001 considerados como o estopim dessa nova onda do medo, uma vez que expuseram ao mundo a sua própria fragilidade (WERMUTH, 2005, p. 8).

No caso do Brasil podemos refletir sobre as questões do racismo estrutural existente, da questão favelas e guetos levados à margem da sociedade, como aponta, Loïc Wacquant (2001):

Articular o conceito de gueto permite-nos distinguir a relação entre “guetização”, pobreza urbana e segregação e, assim, esclarecer as diferenças estruturais e funcionais entre os guetos e os bairros étnicos. Também nos permite salientar o papel do gueto como um incubador social e matriz na produção de uma identidade maculada”; “Seus habitantes sofrem não de duplicação institucional, mas, pelo contrário, de uma falta de estrutura organizacional que seja capaz de sustentá-los na ausência de um emprego rentável e de serviços públicos adequados. Assim como as cidades britânicas e holandesas e os conglomerados de imigrantes da Alemanha urbana ou da Itália, os banlieues franceses são, sociologicamente, antiguetos (WACQUANT, 2001, p. 159-160)

Pode-se considerar que grande parte deste contexto se deve a fragilidade das instituições, ou da capacidade fragilizada destas de se manterem enquanto pilares estruturais da sociedade. O medo surge da percepção de se estar afeto ou jogado a eventualidade, veja nos dias atuais o receio do desemprego, de doenças e não ter condições mínimas existenciais assistidas.

Ao passo desta perda de consciência situacional a gestão, ou, os gestores buscam suas saídas para as crises que se apresentam.  Podemos ver parte destes esforços explorados na busca por informações mais qualificadas, integradas que reflitam a realidade e permitam uma tomada de decisão mais acertada, visão do fenômeno e planejamento adequado.

A integração entre os órgãos e sistemas que monitoram e realizam a gestão da política é um esforço visto no sentido deste objetivo. Abrir a caixa preta das instituições em nome da tomada de decisão coletiva parece ser o caminho óbvio.

No caso de Minas Gerais, tendo em vista a necessidade de se criar uma metodologia de trabalho que pudesse promover a integração operacional das instituições policiais, foi implementado, em 2021, pelo Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais– TJMG, o modelo de organização de gestão integrada do trabalho junto ao Sistema Socioeducativo, denominado Comitê integrado de Apoio a Política Socioeducativa- CIAPS, que reúne ações, informações e conjuga práticas implementadas por diferentes órgãos, como o Ministério Público do Estado de Minas Gerais, a Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública, a Subsecretaria de Atendimento às Medidas Socioeducativas – SUASE, a Polícia Civil e Defensoria Pública do Estado, para propor, apoiar e fomentar ações e projetos possibilitando melhores resultados na execução da política pública.

“Art. 1º Fica instituído o Comitê Integrado de Apoio à Política Socioeducativa – CIAPS, com as seguintes atribuições:

I – monitorar as ações promovidas pelas entidades de atendimento para garantir a realização da socioeducação;

II – propor, apoiar, fomentar e acompanhar a implementação de projetos para a realização dos eixos de educação, esportes, saúde, reinserção familiar e capacitação profissional dos adolescentes no Sistema Socioeducativo do Estado;

III – acompanhar e propor soluções em face de irregularidades verificadas nos procedimentos de apuração e nas inspeções em unidades socioeducativas; IV – propor, fomentar, apoiar e acompanhar projetos de expansão do Sistema Socioeducativo relativos à construção e ampliação de unidades, inclusive em fase de execução;

V – propor, apoiar e acompanhar soluções e projetos para gestão de vagas; VI – implementar a integração das ações promovidas pelos órgãos públicos e entidades com atribuições relativas ao Sistema Socioeducativo;

VII – coordenar seminários em matéria relativa ao Sistema Socioeducativo; VIII – implementar ações conjuntas visando à padronização de procedimentos operacionais e da atuação dos membros das instituições, a fim de aprimorar a prestação da política socioeducativa, dentro do rol das respectivas responsabilidades dos integrantes do CIAPS;

IX – propor, apoiar e acompanhar projetos para otimização do uso dos recursos públicos, captação de novas fontes de receita e de parcerias estratégicas;

X – propor, avaliar, acompanhar e apoiar projetos estratégicos do Sistema Socioeducativo que visem à solução de demandas e/ou melhoria da prestação do serviço”. (MINAS GERAIS, 2021)

No que tange à integração institucional, é inegável o avanço ocorrido, o compartilhamento de informações entre as organizações entre as instituições públicas, é, atualmente, considerado um dos principais focos de potencialidade da atividade de gestão das políticas públicas. Este contexto, nos faz retornar ao nosso ponto de partida, no qual o estado, agindo de maneira isolada, denota sua incapacidade em produzir resposta aos anseios e demandas sociais, permitindo florescer o vazio, ingrediente fértil na produção de uma proposta verdadeiramente inovadora.

As variáveis determinantes que afetam a política socioeducativa, sofreram e sofrem constantes alterações ao longo dos tempos, e suas modificações vincularam características únicas e indissociáveis aos indivíduos das quais fazem parte, sobretudo, ao atendimento que se pretende, gerando suas culturas, seus paradigmas, suas inquietações e dilemas. 

As perspectivas e reflexões apresentadas relacionadas à execução desta pública nos apontam que o desafio está posto, no sentido de viabilizar o cumprimento das previsões consagradas em nossa constituinte, no Estatuto da Criança e do Adolescente e demais normas, promovendo a segurança pública como política pública, cidadã, garantidora de direitos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

“Se a gente quiser modificar alguma coisa, é pelas crianças que devemos começar. Devemos respeitar e educar nossas crianças para que o futuro das nações e do planeta seja digno.” (Ayrton Senna)

O crime, a criminalidade, a violência, não nascem sozinhos, antes da sua emersão, aparecem sintomas diversos e muitos sinais podem ser evidenciados. A falta de conhecimento, dos casos, a ausência de dados técnicos e de produções originadas por órgãos e sistemas verdadeiramente integrados atrasam a compreensão dos fenômenos, reduzindo a capacidade de resposta do administrador. Assim, a capacidade do estado em sua atribuição, em prestar o atendimento, pode se tornar fragilizada e por outras variáveis apresenta-se como incapaz em sua intervenção.

O que se busca no alcance de uma proposta integradora é elevar a possibilidade do Estado, de superar seus gargalos crônicos, em que sua rigidez, e suas distorções burocráticas apresentam-se como aspecto limitadores do sucesso em suas ações visando a qualificação da execução de políticas públicas, conforme versa Motta e Bresser-Pereira (2004):

“[…] todas essas vantagens podem ser condensadas em simplesmente uma: capacidade de prever o comportamento dos membros em uma organização burocrática. Nessas organizações, há crença de que o comportamento dos indivíduos é totalmente previsível, ou seja, sempre ocorrerá dentro de um determinado padrão estabelecido pela organização formal. É claro que a previsão é importante para o alcance da eficiência, pois para planejar metas e controlar a obtenção das mesmas é preciso prever. Dessa forma, prever se transforma em fator essencial para atingir e garantir a eficiência desse sistema social. Acontece, todavia, que isso não garante que, na realidade, ocorrerá a concretização da previsão do comportamento de seus membros. Assim, quando essas previsões não se concretizam, a organização tende a tornar-se ineficiente, ocorrendo as temidas disfunções da burocracia, ou “[…] efeitos não previstos nem desejados da burocracia […]”. (MOTTA; BRESSER-PEREIRA, 2004, p. 34).

Reflexões apresentadas indicam que ainda a muitas perguntas e respostas por vir, contudo, este novo arranjo no Estado de Minas Gerais, aponta achados em direção a importância e premência do fortalecimento do campo da integração e da transversalidade na execução das Políticas Públicas, visando estrategicamente superar distorções da burocracia, como aborda Marx 1976 apud Prando, 2013:

“[…] pela distorção e caricatura de que é vítima, a ‘burocracia’ (sic) passou à (sic) significar incompetência, arbitrariedade, desperdício, excesso de zelo (sic) e sujeição ao controle (sic) governamental […]”. E Matos (1979, p. 25) complementa afirmando que, na atualidade, o significado de burocracia apresenta-se diferente de seu propósito original, qual seja de um sistema de organização, passando a ser relacionada a uma “[…] estrutura organizacional inflacionada, pesada, convencional e emperradora […]”, contudo, não se limitando a somente isso, visto que seu titular, o burocrata, “[…] passa a conceituar o administrador acomodatício, incompetente, desmotivado, ineficaz […]”. O mesmo passa a ser visto como preocupado somente com procedimentos de rotina, o que o torna “[…] responsável pelo retardamento decisório” (MATOS, 1979, p. 25)”. (PRANDO, 2013)

Os processos e métodos, inerentes a implementação das políticas públicas, visam, por essência, traçar soluções para alcance de objetivos frente a um problema público, ou seja, atender o social e coletivo, permeando sempre a individualidade. Tal medida exige dos órgãos e sistemas a constante reinvenção de suas práticas, com vistas a possibilitar a implementação de políticas públicas eficientes, capazes de ampliar sua capacidade promovendo processos de articulação entre o estado e o real atendimento às demandas da sociedade.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília. DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988.

BRASIL. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 16 jul. 1990. Disponível em:

<https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm>. Acesso em:07/10/2021

BRASIL. Lei nº 12.594 de 2012. Institui o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase), regulamenta a execução das medidas socioeducativas destinadas a adolescente que pratique ato infracional; e altera as Leis nºs 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente); 7.560, de 19 de dezembro de 1986, 7.998, de 11 de janeiro de 1990, 5.537, de 21 de novembro de 1968, 8.315, de 23 de dezembro de 1991, 8.706, de 14 de setembro de 1993, os Decretos-Leis nºs 4.048, de 22 de janeiro de 1942, 8.621, de 10 de janeiro de 1946, e a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943. Diário Oficial da União. Brasília, DF, 19 jan. 2012. Disponível em: < https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/lei/l12594.htm>. Acesso em:08/10/2021 

BRASIL. Secretaria Nacional dos Direitos da Criança e Adolescente. Pesquisa de Avaliação do SINASE. Levantamento Anual do Sistema de Atendimento Socioeducativo (SINASE) 2020. Eixo 04: Resultados do SINASE. Centro de Estudos Internacionais sobre Governo. UFRS, Porto Alegre, 2020.

BRASIL. Lei nº 8242, de 12 de outubro de 1991. Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do adolescente. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8242.htm. Acesso em 09 de outubro de 2021.

CASTRO, T.A.P.; SOARES, A.A.; Barroso, A. C. O Sistema Socioeducativo no Brasil. Revista Científica Semana Acadêmica. Fortaleza, 2020, nº196, v.1, jun.2020.

DALLA, A. D. Implantação do modelo de Integração de Gestão em Segurança Pública (IGESP) na cidade de Belo Horizonte: uma visão prospectiva.2006. Monografia (Graduação em Administração Pública). EG/FJP, Belo Horizonte, 2006.

GARLAND, David. La cultura del control.  Crimen y orden social em la sociedad contemporânea. Barcelona: Gedisa Editorial, 2001.

MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça. Portaria Conjunta nº 32/PR -TJMG/2021. Institui o Comitê Integrado de Apoio à Política Socioeducativa. Diário do Judiciário Eletrônico. Belo Horizonte, 14º ano, nº52,18 de mar.2021. Disponível em: < https://www.tjmg.jus.br/data/files/1B/D3/3C/33/52A4871020C7C3875ECB08A8/Portaria%20Conjunta%2032-21.pdf>. Acesso em:08/10/2021

MOTTA, Fernando Cláudio Prestes; BRESSER-PEREIRA, Luiz Carlos. Introdução à organização burocrática. 7. ed. São Paulo: Brasilense, 2004.

Prando, Ana Amélia Fabres. Disfunção Burocrática: Um Estudo de Caso Do Excesso de Papel no DAOCS/UFES. 2013. Dissertação (Mestrado Profissional em Gestão Pública) – Universidade Federal do Espírito Santo, Centro de Ciências Jurídicas e Econômicas. Vitória, 2013.

RAFFESTIN, Claude. Pesquisas em temas de Ciências Humanas. 1. ed. vol. 4. Belém: RFB,1993.

SOARES, L. E. Segurança Pública: presente e futuro. Estudos Avançados. 20 (56), 2006. p.91-106. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/ea/v20n56/28629.pdf>. Acesso em: 11mar. 2017.

WACQUANT, Loïc. Os condenados da cidade: estudo sobre marginalidade avançada. Tradução de João Roberto Martins filho, et al. Rio de Janeiro: Revan. 2001.

_________. Que é gueto? Construindo um conceito sociológico. Revista de Sociologia e Política. n. 23, p. 155-164, nov. 2004.

WERMUTH, Maiquel Ângelo Dezordi. Cultura do Medo e Criminalização Seletiva no Brasil. [S.l.; s.n.], 2005.

ZALUAR, A. Democratização inacabada: fracasso da segurança pública. Estudos Avançados. 21 (61), 2007, p. 31-49. Disponível em:

< http://www.scielo.br/pdf/ea/v21n61/a03v2161.pdf >. Acesso em: 11 mar. 2017.

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui